PIXIES NO SWU E UM APANHADO DO FESTIVAL

Vamos ser sinceros, o SWU foi uma merda – ou perto disso. Quer dizer, pra ser justo, teve algumas coisas positivas, que listo abaixo.

Dentre as coisas boas está o show foda-se-tudo do Rage Against The Machine, perto do histórico, mesmo pra quem viu pelo inconsequente Multishow, que cortou a transmissão no meio; está a porrada do Queens Of The Stone Age; a aula de música alternativa do Yo La Tengo; o balanço do BNegão e os Seletores de Frequência; e, claro, o Pixies.

Os fãs do Linkin Park certamente se irritaram com as 24 músicas (incluindo um bis) do Pixies (eu mesmo ouvi uma tentativa de coro pedindo a banda durante o intervalo para o bis). Não deveriam. Se eles não têm idade suficiente para entender a mudança que o Pixies produziu na música e as canções que empolgam e parecem atuais e diferentes (“alternativas”?) até hoje, precisavam estudar um pouquinho mais. Só que aí é exigir um pouco além da conta pra esse povo.

O Pixies fez um baita show, mesmo que parecesse estar cantando pra poucos. Comparando com o de Curitiba, em 2004, esse foi até meio frustrante, porque o local não era o apropriado, mas, pensando bem, que se dane quem não gosta do Pixies. Com esse setlist, fica impossível um fã não ter saído embasbacado:

01. Bone Machine
02. Isla de Encanta
03. Tame
04. Broken Face
05. Nimrod’s Son
06. Debaser
07. Wave of Mutilation
08. Here Comes Your Man
09. Monkey Gone to Heaven
10. Mr. Grieves
11. Crackity Jones
12. Caribou
13. La La Love You
14. No. 13 Baby
15. Gouge Away
16. Velouria
17. Dig for Fire
18. Allison
19. Hey
20. U-Mass
21. Vamos

BIS
22. Planet of Sound
23. Where is my Mind
24. Gigantic

Exemplos? Que tal “Wave Of Mutilation”?

E “Here Comes Your Man”?

E “Debaser” (nos braços do público)?

Junto com o Pixies, teve um show brilhante, pesado e divertido – muito divertido – do Queens Of The Stone Age. “Sick, Sick, Sick” é uma boa prova:

Esses dois shows (mais os citados Yo La Tengo e o Rage Against The Machine) pesaram bastante pra balança do que foi positivo na conta do SWU. Abaixo, eu dou uma passada item a item do que eu achei importante no festival.

ORGANIZAÇÃO EM GERAL
Nota zero. Um lixo. Trânsito pra ir embora, trânsito pra chegar, empurra-empurra pra entrar. Falta de respeito com o público ao dispor pouca informação, ao tratar todos como gado.

PISTA VIP
Ícone maior da falta de respeito desse festival (e de qualquer festival e show no Brasil). Muita gente reclamou, menos, claro e enfim, quem era VIP. Nesse zoológico de privilegiados estavam (além dos “trouxas” que pagaram um fortuna a mais pelo lugar) jornalistas em geral, blogueiros puxa-sacos do SWU, fotógrafos, “ambientalistas” e pessoas ligadas a ONGs, artistas, músicos (que normalmente se calam quando recebem tal privilégio, dando as costas pros fãs que se acotovelam nas grades), apoiadores (puxa-sacos) do “conceito” do festival e um sei-lá-o-que-tipo de profissionais que nem estavam lá para trabalhar.

O público que pagou caro, bem caro (a despeito dos insistentes contra-argumentos da organização), esse nem que chegasse cedo poderia ficar perto dos seus ídolos.

É bom sempre lembrar às “pessoas muito importantes” que as bandas vêm para o Brasil graças ao dinheiro de patrocinadores e do público. Elas ganham esse privilégio sem sentido graças às pessoas que elas deixam às costas.

Muito se disse sobre o que uma pista VIP significa: a longa experiência do brasileiro com a absurda divisão de classes que existe no País, que leva pessoas a fazerem o diabo, rasgarem o ISO9000 da ética e da lógica, para conseguir estar entre os “eleitos”; e é verdade. Ser VIP te coloca acima dos outros, te dá privilégios que outras pessoas não possuem, mesmo que elas tenham, talvez, até mais direitos de estar ali, por serem elas que bancam a estrutura toda. Ser VIP é bacana, porque te tira do suor e do empurra-empurra da massa, te dá uma etiqueta dourada que o povão não tem. Te dá destaque.

Entretanto, mesmo aqueles que não concordam com a pista VIP talvez não dispensassem um crachazinho que os tiraria do meio dos desafortunados – e os colocaria entre Pittys, champanhes, canapés e banheiros limpos. O brasileiro, portanto, é a contradição de dicionário: xinga, reclama e abomina enquanto o privilégio não é dele. Não falo por todos, mas seria bom pensar nisso.

Em tempo: o assunto é tão apimentado, que o Rock In Rio já anunciou, com um ano de antecedência, que o festival não terá pista VIP.

ENTRADA E SAÍDA
No primeiro dia, sofrimento geral para ir embora. Talvez dê pra contar nos dedos da mão do Lula quantas pessoas não reclamaram da desorganização para tocar dali tanto gado, quer dizer, tanta gente. Táxis chegavam a cobrar R$ 100,00 ou R$ 150,00 por uma corrida a Itu (e quanta gente havia em Sorocaba, Salto, Campinas, Indaiatuba etc.?). Ônibus foram depredados. Pessoas imploravam por um lugar em qualquer van… Caos geral.

No segundo dia, quem estava descolado com os abusos e erros do primeiro, achou uma solução (que foi a que eu achei na segunda-feira): simplesmente sair antes. Terminou o show do Pixies, eu vazei, mesmo que ainda quisesse “curtir” um pouco mais o ambiente (e não a música, que já não fazia mais sentido). Consegui chegar ao hotel com certa tranquilidade. Quem ficou para ver Linkin Park sofreu na saída.

Na entrada, o mesmo martírio. Uma única entrada para um evento que pretendia receber 50 mil pessoas por dia é um absurdo inexplicável. Por que não fazer mais de uma entrada?

A explicação para tanta fila era a revista, que se fazia necessária. Opa, beleza, justificável. Mas diante de tal baderna, de tanta gente, os responsáveis pela revista simplesmente a faziam de maneira superficial, de modo a permitir filmadoras, drogas e até armas brancas (eu mesmo vi um cidadão manipulando um canivete). Filmadoras que se dane, sempre achei que elas deveriam ser permitidas. Drogas, tanto faz, sem elas, talvez, não se faz o show de muita gente – a polícia é que faça o seu trabalho. Agora… um canivete. Bom, o cidadão não arrumou briga com ele – até onde eu sei – mas bem poderia e aí…

No caso de um tumulto qualquer, que tipo de esquema de evacuação as pessoas seguiriam? Nenhum: contaríamos mortes e feridos na mesma magnitude que contamos os erros e falhas do festival. Não havia comunicação de nada.

Estivemos perto de uma tragédia, se o leitor puder imaginar o pior dos quadros.

COMUNICAÇÃO
Nota mínima. Muita gente não recebeu o programa do evento. E eu só vi um totem com a programação, ao lado da roda gigante (roda gigante minúscula, é bom ressaltar, nesse festival das contradições). Saber qual palco era qual (e quais bandas tocavam neles), onde estavam os banheiros, onde estavam as praças de alimentação, sem esse programa, sem o mapa do local, só com muita caminhada – o que nem é tão absurdo assim, afinal.

Se isso é importante, mas pode ser tratado como secundário, não dá pra falar o mesmo das informações de segurança. Repito: não havia informação suficiente sobre como proceder em casos extremos de tumulto.

SEGURANÇA
Pode acreditar, mas acho que foi o ponto mais satisfatório de toda a organização – embora, contraditoriamente, não tenha vindo da organização do festival o que mereça mais aplausos.

Nunca achei que fosse falar isso, que fosse aplaudir a Polícia Militar, mas havia um contingente enorme de policiais no lado de fora do evento, principalmente na saída, e todos os homens e mulheres de farda estavam muito bem orientados sobre como tratar o público – e, veja, procederam de maneira primorosa.

Conto um caso: estava caminhando em direção aos táxis e ao passar pelo portão principal, um xaropeta de um moleque, sem camisa (já dá pra notar como ele estava alterado), correu em direção aos guardas, só pelo prazer de tirar uma. Em condições normais de temperatura e pressão, o tal avariado teria tomado uma bordoada que nunca mais iria esquecer. Porém, o policial deu apenas um passo atrás e pediu gentilmente para o guri se afastar. Vendo que a provocação/brincadeira não deu certo, o rapaz sentiu o frio que estava fazendo, vestiu sua camisa, engoliu seco, juntou-se aos outros amigos e foi embora com calma e tranquilidade.

A gratuidade do “ataque” do moleque é um bom exemplo de como a polícia deve se portar diante de jovens extasiados por participar de uma experiência como o SWU. Para muitos, é o primeiro festival e excessos realmente acontecem.

Se a polícia merece palmas, os seguranças oficiais do evento nem tanto. Não por truculência ou falta de tato com o público. Não vi nenhum problema grave nesse sentido – e se ocorreu, foi um fato isolado. Mas foi uma segurança ausente. Isso quer dizer que não se via com frequência esses profissionais. Em muitos casos, pode ser uma boa notícia. É como juiz de futebol: se ele não aparece, é porque o espetáculo foi bom. Só que no caso da segurança é bom, sim, que os homens apareçam. Com tanta droga e breja rolando, não custa mostrar que eles estão por ali, só por via das dúvidas.

Digo isso sem querer parecer o Datena, procure entender…

BANHEIROS
Nota zero, mas só porque não dá pra dar menos. Eles eram poucos e imundos. A organização pode até argumentar que quem suja são os usuários. Perfeito, são os usuários mal educados, é o povão, essa gente feia e suja que não pode usar os banheiros limpinhos dispostos aos privilegiados desse Brasilzão das áreas VIPs, que suja e depreda o próprio patrimônio. Mas peralá: não dá pra ir limpando, não? São banheiros químicos. Não custa lembrar que são iguais aos de outros tantos shows, como o do Radiohead, que tinham quase cheiro de pinho sol.

O resultado é que as paredes e divisórias e qualquer cantinho e árvore virou mictório para os camaradas apertados e longe demais do banheiro mais próximo. O cheiro não deixava negar – e a segurança, ao menos, não tentou impedir a utilização do “banheiro público”: seria tanto nego expulso que só ia sobrar mulher no festival.

SUJEIRA E LIXO
Nota zero, tal e qual o conceito do evento. “Começa com você” de cu é rola. Com todo respeito, sustentabilidade é cuidar bem das pessoas e só depois pensar no resto. Lembre-se: nós também somos “natureza”, oras. Afinal, todo mundo pensa no planeta que queremos deixar para os nossos filhos, mas ninguém pensa nos filhos que queremos deixar para o planeta. Mais uma pra conta do festival-contradição.

É claro que um bando de moleques – qual a porcentagem de gente de 20 a 27 anos tinha no festival? – faria o que se fez em toda a área do evento: lixo e sujeira pra todo lado. Havia uma boa quantidade de latões de lixo, mas não nas áreas mais importantes, perto dos palcos, ou na direção dos palcos, no meio da muvuca.

Ou alguém acha que no meio do show do Kings Of Leon, por exemplo, o cidadão que tá tomando uma cerveja vai sair do seu lugar, conquistado com uma boa dose de empurrões, pisões em pés alheios e resmungos, e procurar um desses latões pra depositar civilizadamente seu copo plástico (plástico… copo plástico em evento “sustentável”)? Não vai. Para isso, é preciso que o próprio festival providencie a limpeza. Simples assim. Não dá pra transferir a culpa aos próprios clientes/consumidores/fãs.

Seria lindo se todos tivessem educação suficiente para não jogar nada no chão e procurar um cesto de lixo mais próximo. Esse seria o mundo ideal, mas, ei, num país em que as pistas VIPs são aceitas, criadas e estimuladas por organizadores de eventos, o que se pode esperar da educação dessa classe média adepta do vale-tudo-egoísta, do cada-um-por-si, do “você sabe com quem tá falando?”?

Portanto, SWU, o seu discursinho besta pode até funcionar para atrair verba de patrocínio, para fazer os incautos pensarem um pouco no assunto, mas não vai ensinar nem educar ninguém. Esse trabalho deve ser feito pelas famílias, pelas escolas e pelo convívio com pessoas que pensem e ajam da mesma maneira. Da mesma forma, é outro reflexo de uma sociedade elitista, que privatiza a escola pública e apoia pistas VIPs, áreas de segregação delimitadas pelo tamanho da conta bancária de cada um.

Cabe a pergunta: alguém viu a sujeira que estava na área VIP? Pois é, os VIPs sujam tanto quanto o povão…

COMIDA E BEBIDA
Nota cinco, porque vale dispor várias observações aqui. Uma delas é que quando se trata de ganhar um bom cascalho a mais, a “tecnologia da organização” funciona. Havia vários caixas e, salvo poucas exceções durante o dia, quase nenhuma fila para comprar as fichas.

Pra quem tomava só cerveja, nem comprar as fichas era preciso, já que vários vendedores ambulantes, oferecendo latinhas a um real a mais que o preço oficial, estavam circulando entre o público. Ótima ideia, bela iniciativa (que ainda dá oportunidade de ganho a moradores da região).

Porém, problemas não faltaram. Tentou usar cartão de débito? Impossível em determinada hora do dia. A desculpa era de “queda de sistema”. Ora, então tem caixas eletrônicos por aí, pra sacar dinheiro, certo? Tá pedindo demais, rapaz! O cidadão morre de fome, de sede ou sei lá mais o quê, porque a partir do momento que é avisado sobre a opção de compra eletrônica, corre-se o risco de um ou outro desavisado se fiar nisso e ficar sem poder consumir nada.

Pra quem é descolado em shows e festivais (normalmente mal organizados, tirando a honrosa presença do Planeta Terra), sabe que é melhor aparecer só com dinheiro vivo. Mas, repito, a maioria ali talvez estivesse no seu primeiro festival e, sem comunicação criteriosa e farta, deu no que deu.

No quesito preço, melhor nem tocar no assunto. Ou alguém acha barato pagar 10 reais por cheeseburguer frouxo, ou oito reais por uma pizza de azia?

E ainda havia as filas e a falta de produtos (batata frita acabou, por exemplo)… Como sempre, que se dane o público que paga caro…

SOM
Nota dez. Até mesmo na tenda da Oi. Esse tipo de festival tem tudo para dar errado quando se trata de qualidade de emissão e distribuição de som. No SWU, a técnica deu show. Não havia pontos “cegos” de som, salvo quando o vento batia (mas aí, amigo, pelamordedeus, certo?), além de um palco não comer o som do outro. Maravilha.

LOCAL
Embora eu aplauda o fato de um festival com essa envergadura seja feito fora de São Paulo, uma cidade que não cabe nem mais uma aglomeração de 5 mil pessoas sem se refletir em caos, pouco se fez pela chegada das pessoas no local. Táxi de São Paulo era piada de mal gosto. Os ônibus que saíam de Itu pareciam lata de sardinha, com muita sardinha. Os hotéis na região, lotados e a preços abusivos (ok, ok, a lei da oferta e da procura…). O camping… Bom, nem passei perto. Estacionamento a preços risíveis.

Só a orientação na estrada é que merece elogios. Só se perdia quem quisesse.

A Fazenda Maeda é um baita local pra shows, a escolha foi perfeita. Só a execução que não.

SHOWS
Pixies, Yo La Tengo, Queens Of Stone Age, Rage Against The Machine, Cavalera Conspiracy, BNegão já valiam um espetáculo, um festival. Precisava de todo o lixo adjacente?

CONCEITO
Festival com conceito que não seja musical não dá. Zero, nota zero. Cheirou a cascata, a embromation (incluindo aquele fórum de onde nada se tirou de produtivo – afirmação que não me pertence), a enganação para essa juventude desinformada comprar.

Foi o festival mais pretensioso que já vi, em todos os aspectos, mais até do que o Rock In Rio. Pretensioso e arrogante: admitir os erros é edificante. Ninguém deve ter compromisso com o erro.

Se ano que vem tiver uma nova edição, que se tome por aprendizado os muitos e intermináveis equívocos dessa edição. Torço para que tenha. Entretanto, torço mais ainda para a humildade tome conta do pessoal do Fischer e que ele aprenda com o desastre de 2010.

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