BLUE BEAST – DEVIL MAY CARE

Eis um trabalho cheio de referências e interligações biográficas. O BLUE BEAST, duo formado por Truus De Groot e Miguel Barella, lançou em 16 de dezembro de 2016 “Devil May Care”, um trabalho de altas credenciais que infelizmente foi pouco ouvido e esquecido pela “crítica especializada” quando da análise dos melhores do ano.

Miguel Barella tem estrada atrás de si. Muita. Nos anos oitenta, foi co-fundador de grupos como Voluntários Da Pátria (um dos preferidos aqui da casa) e Agentss. Trabalhou com Júlio Barroso, Akira S e fez dupla com Thomas Rohrer. Já tocou ao vivo com Mai-Mai, Mauricio Takara, Rob Muzarek, Jim Sclavunos e coloca etecetera aí.

Já a holandesa Truss De Groot é do Plus Instruments, importante banda do subterrâneo nova-iorquino na mesma década e que lançou um bom disco recentemente, “Signal Through The Waves”, de 2016 (ouça aqui). “Februari – April ’81”, de 1981, tem composições de Lee Ranaldo, do Sonic Youth, pra se ter ideia.

Em 2014, ela foi convidada pra tocar na Virada Cultural da cidade de São Paulo, com Paulo Beto (da anvilFX – De Groot participa do divertido disco mais recente da dupla, “Prova De Biologia”, de 2015 – ouça aqui). Jim Sclavunos (do Nick Cave & The Bad Seeds) se juntou na bateria, e Miguel Barella empunhou a guitarra.

A conjuminância no palco entre De Groot e Barella rendeu a intenção de colaborarem juntos musicalmente, o que acabou acontecendo em 2016, quando trocaram ideias, músicas, arquivos e assim nasceu o Blue Beast, que tem o DNA musical do Plus Instruments, mas com a preciosa adição da guitarra irrequieta de Barella.

O resultado são doze canções onde as teclas e o vocal misterioso de De Groot são embasados por uma guitarra sempre na linha de frente da surpresa – “Confort Zone” é um bom exemplo. A música envolve como se o ouvinte entrasse num estreito e claustrofóbico labirinto e fosse perseguido pelo alucinado Jack Nicholson de “O Iluminado”.

Ouça “Confort Zone”:

A voz de De Groot carrega uma dramaticidade alucinante. Ora misteriosa (ouça a angustiante “Don’t Scream” – “você não precisa gritar pra cantar uma canção, não grite, não grite”, uma espetada nas “divas” pop atuais), ora agressiva, ora abrasiva, ela consegue atingir o ouvinte de muitas maneiras. Mas talvez ela só consiga o impacto que conseguiu aqui – afinal no Plus Instruments ela tem intensidade aproximada a essa – porque a guitarra de Barella joga com o improvável lá atrás, sem uma melodia padrão, sem facilitar. É um improviso-calculado: enquanto a voz espelha em sua liturgia dramática, o instrumento faz o clima, oferece o caminho da compreensão ao ouvinte.

“Devil May Care” é um disco com cara dos anos oitenta, sem ser revisionista. Não foi feito ao sucesso, ao popular, e por isso não precisa se curvar a nenhum tipo de ligação histórica ou atual, embora seja, no seu princípio, um disco cheio de ligações históricas, seja na bio dos autores, seja na sonoridade.

É um trabalho precioso que ficou escondido nos subterrâneos da música nacional em 2016. Não só o diabo: você também deveria se importar e ouvir.

“This Store Is Closed”:

O disco foi arranjado e mixado pela dupla, gravado em São Paulo e na Califórnia. A masterização é de Patrick Derivaz (de trabalhos com John Cale, Phillp Glass, Will.I.Am, Jeff Buckley e Tom Verlaine).

01. Confort Zone
02. Don’t Scream
03. Heartbreakville
04. Love To Misery
05. Flying
06. This Store Is Closed
07. Vega Forever
08. Walk That Line
09. Searching
10. Enough Is Enough
11. Love Is Beautiful
12. More Than You Know

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