ENTREVISTA: MAVKA – O COMEÇO DE TUDO

São menos de seis meses “de vida”. E o Mavka já faz barulho dos bons. Não me refiro à música em si, mas à repercussão que o primeiro EP, “Mavka”, gerou.

Burburinho que me levou à Casa Dissenso, dia 7 de maio, pra ouvir a banda de perto e, claro, conseguir uma entrevista (que virou este post). Óbvio que se a banda tivesse negado fogo no palco, ainda havia Transmission e Huey naquela noite, o que tornaria a empreitada safa de qualquer erro. Porém, o que era desconfiança virou uma certeza deliciosa, um grande prazer. O Mavka correspondeu.

Antes de subir ao palco (“subir” é modo de dizer, na Casa Dissenso não há palco na conotação de “altar”), juntaram-se a nós, numa das mesinhas na calçada, pro bate-papo, Bea Rodrigues (baixo e voz), Duda Caciatori (teclado), Pedro Yue (guitarra) e Victor V-B, o Gringo (bateria e voz). Todos na faixa dos 20 anos, todos tímidos e todos se divertindo, como deve ser.

O papo rolou durante pouco menos de 30 minutos. Há um mínimo a destrinchar numa banda que tem menos de um ano de vida. Entretanto é fascinante ver o nascimento do que pode ser uma longa caminhada. É um começo inclusive pra eles: os quatro meio que se conheceram durante o processo de formar uma banda, nem amigos de longa data são, como é comum nesses casos.

Trajetórias diferentes, caminhos que se cruzam, vidas que se encontram… A isso normalmente se dá o nome de destino.

E se você acredita nesse papo de que cada um cumpre uma missão na Terra, naquele lance sobrenatural a que os religiosos se apegam pra justificar o que a ciência (ainda) não conseguiu explicar, é possível dizer que as duas beldades (sim, Duda e Bea são lindas) e os dois boas-praça (sim, Gringo e Pedro são gente-finíssima) estão começando a cumprir o que talvez seja o grande feito deles nessa vida.

Torçamos, a partir de agora, pra que não seja o único. Que seja apenas o começo.

Floga-se: Começando pelo básico… Como começou o Mavka?

Bea Rodrigues: Conheci o Pedro em sabe-se lá que momento da nossa vida e falei “vamos montar uma banda?”, ele falou “vamos, mas essa é minha última tentativa de banda”. Eu também disse “não quero mais depois dessa”… Eu tinha acabado de sair da Madeleine K e não queria mais… Aí, a gente conheceu o Gringo e a Duda a gente já conhecia há um tempinho… Falei “Duda, vamos tocar teclado”; “vamos”, e foi assim que aconteceu. Simples.

Floga-se: Mas como surgiram as músicas? Vocês queriam fazer uma banda. Imagina-se que já existiam músicas na cabeça de alguém.

Victor V-B: No começo, era só eu, o Pedro e Bea. A gente se juntou e tocou. Simples assim. Depois, a gente achou que deveria colocar a Duda. Ela ia tocar percussão!

Duda Caciaroti: (rindo) Daí, a primeira vez que eu peguei um teclado na mão foi pra tocar no Mavka. E foi acontecendo, foi fluindo, tomando uma cara.

BR: É, mas o Pedro me mandou uma música da antiga banda dele, que eles nunca lançaram. “Ah, isso é legal, vamos partir disso”, mas na verdade a gente nunca mais usou aquela música pra porra nenhuma. Não tinha nem letra. Foi um pretexto pra começar. Então, quando a gente se juntou, e o Pedro já tinha alguma coisa, um rife e tals, o resto foi fluindo mesmo.

F-se: Quantas músicas vocês têm hoje?

BR: São as quatro do EP e mais duas. A gente faz um show com seis. Mas é o começo. Há ainda dois rascunhos, que é essa primeira e um outro rife bem legal que a gente ainda não conseguiu reaproveitar.

Pedro Yue: A banda tem seis meses (a entrevista foi feita em 7 de maio de 2011).

DC: É, seis meses contando essa parte que ainda não tinha uma identidade, né? Os primeiros dois meses, a gente tava só se reunindo, se encontrando, e não dava pra saber o que ia ser. Foi tomar forma em dezembro de 2010, mais ou menos. Em janeiro, que pegou firme pra fechar as músicas. O primeiro show foi em 2011, o EP é de 2011. Somos de 2011.

V V-B: A composição é coletiva: alguém chega com uma ideia e a gente vai mudando, vai completando.

BR: Engraçado é que a gente adotou um processo de composição à distância muito interessante. O Pedro manda um rife e eu fico ouvindo aqui em casa e chego no ensaio com melodia. Funciona bem pra gente. E poupa um pouco de tempo.

PY: É bom também porque num ensaio eu não consigo ter ideias. Não funciona pra mim. É melhor tá em casa, de madrugada, daí sai alguma coisa na guitarra.

F-se: A banda é de Sorocaba… Mas vocês não moram todos lá. Como ensaiam?

BR: Os três moram lá, menos eu. Quando eu tenho folga do meu trabalho, a gente consegue ensaiar.

Pedro Yue: Normalmente, nos finais de semana. Todo mundo trabalha aqui e fica difícil. Eu sou programador, o Gringo dá aulas de inglês, a Bea é editora de imagens e a Duda trabalha com produção cultural.

F-se: Então, a banda é só diversão?

BR: Não que a gente encare isso como um trabalho, mas se a gente puder chegar um dia num ponto em que a gente pode viver dela, ótimo.

DC: A gente quer se dedicar à banda. Seria bom ganhar dinheiro pra se dedicar exclusivamente a ela.

PY: É a arte.

BR: É o compromisso com a música, não com o dinheiro. O que vier é lucro.

F-se: Nesse curto período, mesmo sem conhecer a fundo o gosto de cada um, vocês se descobriram amigos e conseguiram casar esses gostos, certo?

V V-B: (após um coro em concordância…) O mais interessante é que o que tá saindo agora é um som que ninguém imaginava que iria sair. Cada um de nós vem de uma “escola” diferente. O nosso som preserva bastante a intenção de cada um. Misturou muita coisa diferente, sem problemas.

BR: Há uma dificuldade de falar as referências de cada um. Não dá pra saber (pela nossa música). Porque eu nunca consegui pensar assim: “hoje vou fazer uma música tipo Sonic Youth”…

DC: É difícil dizer o que ficou na nossa música e o que não ficou do gosto de cada um. Não foi muito pensado. Foi mudando aos poucos, nos ensaios.

PY: Eu gosto de grunge e a gente não tem nada de grunge.

BR: A banda até tem evitado umas distorções muito sujas. Antes eu usava um pedal de distorção no meu baixo, que foi abolido, limpamos as distorções na guitarra do Pedro…. A gente saiu do grunge e fomos pro que chamam de noise.

F-se: A recepção do EP na Internet tá sendo boa?

BR: Cara, só o fato de você estar aqui, entrevistando a gente, já faz essa recepção ser incrível.

V V-B: Nos shows a gente sente o público curtindo, mesmo que não gostem do tipo de som, mas as pessoas tão lá ou porque já conheceram antes, já ouviram antes.

DC: É legal tocar fora de Sorocaba, porque não tem aquela resposta só de amigos e família. As respostas aos shows são até mais calorosas do que às do EP. É o contato real.

BR: Foi legal que no dia do lançamento do EP, duzentas e tantas pessoas deram share no link lá no Facebook. Caraca, em um dia, como assim? Mas a gente acha melhor nem contar quantos downloads foram feitos (faz uma cara envergonhada)…

F-se: O que vocês acham que é ser popular? Até onde vocês querem e podem chegar com o Mavka?

BR: Não sei… Melhor pensar nisso quando isso um dia vier a acontecer de fato. Nunca parei pra pensar nisso. Na verdade, nunca foi um dilema, uma preocupação, nem nada. A gente tá mais focado em fazer música e ensaiar pros shows.

DC: Acho que a gente nunca pensou muito na frente, tão na frente assim. O compromisso da gente com a gente mesmo.

V V-B: Não gosto quando uma banda tenta “empurrar” algo pra você, sabe? A despreocupação (nesse sentido) é tanta que a gente só colocou o link lá, quem quiser baixar baixa e é isso. A banda não ficou forçando a barra.

F-se: O que vem daqui pra frente?

BR: Existe a possibilidade de um disco com mais músicas, no final do ano, lá pra novembro, lançado por nós mesmo. Eventualmente, se algum selo quiser adotar, ok: a gente continua produzindo e o selo só divulgaria. É uma postura que o gringo tem bastante, que é o “do it yourself”, não espere de ninguém, vai lá e faça você mesmo.

PY: Ter um produtor acho que faz a gente perder a sinceridade que a gente tem pelo trabalho. Prefiro, por enquanto, fazer do jeito que a gente tá fazendo…

DC: Não será um EP. É um disco mesmo, com mais faixas, só que no mesmo esquema de recortar e montar por nossa conta.

F-se: As quatro deste EP estarão nesse disco?

DC: Olha, não sei… Não pensamos nisso. Tem que ver como vai tá até lá.

F-se: Quem fez a capa desse primeiro EP?

BR: Foi o trabalho de duas pessoas. A gente pensou na ideia e uma amiga nossa, a Samantha (Pires), fez o desenho original; aí, o diretor de arte do jornal onde trabalho, o (Milton) Toller, diagramou, deu uma aprimorada; e daí saiu a versão final da capa.

Veja a banda tocando “Ribbons”, do EP homônimo, na Casa Dissenso, no último dia 7 de maio:

F-se: Uma pergunta intrigante… Que história é essa de mitologia ucraniana, que explica o nome da banda?

( risos gerais)

V V-B: Até hoje eu não sei o que quer dizer Mavka direito (mais risos).

BR: Calma, calma… Uma das minhas origens é húngara e eu tenho muita conexão com a cultura eslava. Antes o nome da banda era pra ser Bratslava, a capital da Eslováquia… Mas já existia uma banda com esse nome, deu uma dor no coração…

DC: Aí começou a pesquisa e o Pedro achou sem querer. Um nome pequeno e com significado forte.

BR: Ele achou num lance da Ucrânia, mandou a mitologia pra gente, e eu nunca tinha ouvido falar da Mavka.

DC: É quase o equivalente a uma entidade do candomblé, a Iansã. É uma mulher poderosa, da floresta, que tem o poder do vento, do trovão e ela atrai pra essa floresta os homens que matam e estupram mulheres. E a Mavka mata esses homens fazendo cócegas! (segundo o release de apresentação da banda, “Mavka é uma ninfa, representante das almas das jovens suicidas ou assassinadas. Diz a lenda que as Mavkas cultivam flores nas montanhas para seduzir os rapazes, a quem fazem cócegas até a morte. Assim como a história das ninfas, o som da banda sorocabana Mavka é carregado de angústia, caos e doçura”).

BR: É uma doçura violenta. Como o nosso som. A gente só percebeu essa analogia depois, não foi de propósito.

Floga-se: Pelo Gringo ser professor de inglês, ser estadunidense nato, escrever em inglês é natural, espontâneo?

BR: Isso é e sempre foi polêmico, porque no início de tudo eu sempre quis fazer músicas em inglês. Minha banda anterior fazia em português e eu queria fazer diferente. O Pedro e eu tivemos eternas discussões, depois com a Duda e o Gringo… E é muito bom ter um sujeito de lá (dos Esteites), porque minhas letrar podem passar por revisão (risos).

DC: Até hoje a gente fala sobre isso. Ainda é polêmico. Mas acaba sendo mais fácil compor em inglês, não ter um motivo especial.

V V-B: Meu português não tá suficientemente bom pra compor na língua. Eu pensei muito: “pô, tô aqui no Brasil, quero compor em português”. Mas eu nasci na Filadélfia e tô só há um ano e meio aqui, então não dava mesmo.

Floga-se: Por que tem tanta banda boa em Sorocaba?

BR: Porque a cena foi uma bosta por muito tempo. Acho que isso fez galera se movimentar e querer fazer algo.

PY: Hoje tem bastante coisa. Já teve o Wry, o Vzyadoq Moe, hoje tem o Iansã, o INI…

DC: Tem tanta banda… A cena sempre se manteve, foi renovando as bandas… Mas é uma cena forte, com público legal, a galera vai, gosta dos shows, vê até o fim, compra CD. Eu vim de Santa Catarina e é bem diferente de lá. E quando cheguei em Sorocaba, me espante: “como assim, tem tanta banda aqui?”.

V V-B: Sorocaba tem um lance legal que chega muita informação lá. Tem o pessoal do Wry que morou em Londres, por exemplo. Tem uma galera que viaja e traz informação de fora.

Floga-se: O Mavka tá recebendo muito convite pra shows?

PY: A gente nunca marcou um show. Até agora, ainda bem, vieram atrás da gente.

V V-B: A preocupação até aqui era ver os detalhes do EP, mas aí foi rolando um showzinho aqui, outro ali…

DC: Ah, lá em Sorocaba é lindo! O Asteroid, o Mário… É muito firmeza, tem o pessoal do Rasgada Coletiva. Então, tá rolando show, sim.

BR: Em São Paulo, esse é só o segundo, mas outros virão por aí.

Veja a banda tocando “Dylan’s Song (John’s Dead)”, do EP homônimo, na Casa Dissenso, no último dia 7 de maio:

Conheça mais do Mavka
Site: http://www.mavkamusic.com/
Twitter: http://www.twitter.com/mavkamusic
Facebook: http://www.facebook.com/mavkamavka

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