O sexto disco do maranhense-carioca Negro Léo, “Desejo De Lacrar”, é também o, por assim dizer, “mais curioso”. Pra quem tem no currículo trabalhos mais intensos, como “Niños Heroes” (2015, ouça aqui) e “Action Lekking” (2017, ouça aqui), o disco sobre a noção de imagem e identidade que temos hoje reforça o incômodo vocalizado que o artista dá pras relações sociais atuais.
Não é só ele que se incomoda, muita gente se irrita com a metralhadora giratória da hipocrisia nas redes sociais. Até porque, querendo ou não, sempre somos atingidos.
Mas a lacração é um troço curioso. Uma via de duas mãos. E o disco de Léo tem essa curiosidade por poder ser visto como… “uma lacração”. Claro, não é preciso ser versado em nada pra entender isso. O que nos coloca no próximo passo.
Léo, sabendo do recurso, usa e abusa. “Quis justiçar / Mal comecei”, ele canta (em “Dança Erradassa”). “Só por prazer, não por vingança / Um desejo irresponsável de criança / Eu quis ve-la sangrar / aquela quantidade enorme / de sangue azul” (na balada-vingativa-de-traição “Eu Lacrei”).
Não é preciso ir muito longe no disco pra entender que como poesia escrita ele não poderia chegar muito longe. Eis como disco pode ser ainda mais “curioso”. Negro Léo é um artista e não só músico ou cantor. Ele interpreta suas canções, como fazia Arrigo Barnabé, por exemplo, outro poeta do “atual”.
E suas interpretações é que fazem de seus discos algo prazeroso. Aqui, estupendo. Seus falsetes, seus choros debochados (em “Absolutíssimo Lacrador”, seus instrumentos vocais (como em “Esplanada” e “The Big One”), tudo faz o ouvinte imaginar alguém em cima do palco, numa peça, e seus álbuns temáticos a versão musical disso.
Por outro lado, não é um disco “fácil” no sentido “comercial” (precisa ser ou precisa mudar o tal sentido “comercial”?). Mas vale ressaltar tal detalhe porque a mensagem não vai chegar a todo mundo, infelizmente – não deixe de ouvir a maravilhosa “Outra Cidade”, que encerra a obra.
Na “lacrolândia”, como a direita raivosa gosta de chamar a esquerda soberba, o disco vai passar batido.
Mas um artista como Negro Léo nunca deveria passar batido.
O disco foi lançado em 17 de julho de 2020, palas mãos da importante etiqueta QTV, com a YBMusic.
A produção é do baterista Sergio Machado, com direção artística do próprio Léo – e, sinceramente, sendo a alma do disco, nem poderia ser diferente.
Mixagem e masterização levam a assinatura de Nick Graham Smith. A gravação é de Diego Techera e Fernando Rischbieter, nos Estudios YBmusic, em São Paulo.
01. Desejo De Lacrar
02. Dança Erradassa
03. Eu Lacrei
04. Absolutíssimo Lacrador
05. Esplanada
06. Makes E Fakes
07. Desvio Pro Vermelho
08. Tudo Foi Feito Pra Gente Lacrar
09. The Big One
10. Outra Cidade