UM SHOW DE ROCK NO MONTE EVERESTE

São 8.848,43 metros de altura (com gelo), o “topo do mundo”, o “dedo que toca o céu”, o Monte Evereste.

Não dá pra colocar uma banda de rock pra tocar ali em cima. Seria impossível carregar os equipamentos de som e filmagem, os instrumentos e os músicos, que não são também alpinistas profissionais.

Mas uma banda da Finlândia, a Ancara, em parceria com o rapper surdo, que se expressa pela língua dos sinais, Signmark, teve a ideia de tentar. Não nos quase nove mil metros de altura, mas algo mais modesto: num dos acampamentos-base, o do lado sul, no Nepal, a 5.364 metros.

O objetivo era fazer o “show de rock no lugar mais alto que já se teve notícia”. E banda e rapper partiram atrás de patrocínio e treinamento. Conseguiram.

Nesse meio tempo, ocorreram os terremotos devastadores no Nepal, em abril e maio de 2015. Se a ideia antes era “levar a música da banda ao mais alto nível”, segundo seus integrantes, agora eles tinham um objetivo a mais, arrecadar dinheiro suficiente pra reconstruir uma escola de música, em Catmandu, dizimada pelos tremores (à qual dariam o nome de Rockin’ High, o título do projeto deles).

Diz-se que o melhor período pra subir o Evereste é entre maio e outubro, quando o tempo é mais firme e claro, temperaturas melhores, e dificilmente chove e neva. Mas por conta dos terremotos o projeto teve que ser adiado. Passou pro período mais crítico, o inverno, que vai de novembro a abril.

O inverno tem neve, é gelado e venta um bocado. É muito frio pra acampar, mas o cenário gelado é muito mais bonito, com tempo limpo e seco. O mais importante: é a época mais vazia de turistas e alpinistas, ideal pra aventura proposta por esses finlandeses. Definiu-se, então, a data: a primeira semana de novembro.

A aventura durou dezoito dias. A banda, formada por Sammy Salminen (vocal) Toni Hintikka (baixo), Tuomas Keskinen (guitarra e vocal), Juha Wahlsten (guitarra) e Rale Tiiainen (bateria), junto com os rappers Signmark e Olli Hartonen, e a equipe de filmagem, subiram com os xerpas (etnia da região mais montanhosa do Nepal, os guias e carregadores oficiais dos alpinistas) pra aclimatação, treino e testes de carregamento.

Definiram que o equipamento deveria ser o mais leve possível: levariam, além dos instrumentos, uma mesa de dezesseis canais QSC TouchMix e um par de caixas K Series. “Encontrar um sistema de som pra escalar o Everest foi uma tarefa difícil, pra dizer o mínimo. Precisávamos de um novo sistema pra atender a muitos requisitos – robusto o suficiente pra um clima extremo, confiável e fácil de ligar e tocar, pra que pudéssemos fazer a passagem de som em qualquer lugar, leve e fácil de embalar e carregar; e, acima de tudo, poderoso o suficiente pra oferecer um grande som num concerto de rock ao ar livre e ao vivo no topo de uma montanha”, disse o vocalista Salminen.

O som da Ancara é um metal romântico-farofa, sem nenhuma grande reverência mundial até aqui. A banda lançou três discos, “The Dawn” (2005), “Beyond The Dark” (2007) e “Chasing Shadows” ‎(2009). O projeto “Rockin High” seria seu grande feito.

O Signmark também lançou três discos, “Signmark” (2006), “Breaking The Rules” (2010) e “Silent Shout” (2014), mas ganhou mais notoriedade justamente pela proposta: um rapper que se expressa pela língua dos sinais.

Não é fácil pra um bando de amadores, que nem alpinistas são, tentarem tal façanha. A partir de três mil metros de altura, o corpo humano começa a reagir à falta de oxigênio. Mascar folhas de coca pode ajudar. Acima de cinco mil metros, o ser humano não consegue se adaptar a ponto de se estabelecer e fixar moradia, por exemplo. O aproveitamento de oxigênio cai pra 50% e a pessoa fica com reflexos e estabilidade comprometidas. Era esse o cenário que os músicos estavam dispostos a enfrentar.

No dia 9 de novembro de 2015, porém, Ancara e Signmark ficaram presos em Dingboche, a mais popular parada pros montanhistas que se aventuram no Evereste. A cidade do Nepal está a 4.530 metros de altitude e tem apenas duzentos habitantes – é insano morar num lugar desses.

Por conta dos terremotos, a vila estava ainda em reconstrução, afetada inclusive com o decréscimo de 70% da quantidade de turistas, ainda temorosos com os tremores. A equipe chegou a uma Dingboche ainda em processo de se reerguer, com turistas voltando aos poucos.

Eles tiveram que parar na vila porque nem todos os integrantes tinham forças pra continuar subindo. O planejado era fazer o show no acampamento-base dia 15 de novembro. Mas isso não aconteceu. Parte do grupo chegou ao acampamento-base dia 12 de novembro, a 5.364 metros. Uma pequena apresentação acústica foi realizada ali. O show principal teria que acontecer mesmo em Dingboche.

Foi o que rolou. Dia 15 de novembro, a equipe montou o equipamento e Ancara e Signmark tocaram e gravaram. A apresentação a 4.530 metros de altura acabou no Guiness Book como o “concerto na maior altitude já realizado”.

Um filme foi realizado pra retratar a aventura. “Rockin’ High: The Highest Gig In The World” foi lançado na tevê finlandesa em 2015, com cinquenta minutos de duração. O show foi transmitindo pela Internet em tempo real, bem como várias passagens da aventura, desde a Finlândia. Várias fotos do projeto estão aqui (vale a pena – já o site oficial é esse aqui).

É uma aventura no mínimo curiosa e os músicos conseguiram o que queriam: levaram sua arte pra “um novo patamar”. No caso, quase o topo do mundo.

Aqui a apresentação do Signmark, com a Ancara (note que a certa altura Signmark fica com CALOR e tira sua blusa pra ficar mais confortável):

E aqui a apresentação da Ancara:

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