ARCADE FIRE NO SAMBÓDROMO DE SP – COMO FOI

Com “Everything Now”, o Arcade Fire achou que podia se posicionar como um U2 no quesito grandeza de venda de ingressos. A guinada ao pop mais “fácil” no disco, porém, surtiu um efeito contrário: afastou os fãs de primeira leva e não atraiu novos consumidores. O resultado é que a banda enfrenta casas de shows vazias e um fracasso inesperado. É uma pena, porque há potencial.

O fenômeno do fracasso mundial chegou ao Brasil, o país com mais adeptos da “cultura do imperdível”, algo que não se reverte em vendas. O “imperdível” Arcade Fire se tornou um mico nas mãos dos promotores, que tiveram que rever a planta do show, passando do estacionamento do Anhembi pro Sambódromo, mais precisamente pro recuo da bateria das escolas de samba, numa configuração pra menos da metade das pessoas ambicionadas a princípio.

Curiosamente, essa mudança foi benéfica. Por conta da estúpida ideia de “pista premium” em frente ao palco, os fãs “menos afortunados financeiramente” deveriam ficar numa pista mais afastada. Com a mudança de configuração, essa pista afastada virou uma arquibancada e o local ganhou a forma de um anfiteatro com visão e som ótimos pra todo mundo.

A produção alega que com as promoções sucessivas de última hora a venda de ingressos chegou a dez mil. É provável que houvesse menos gente, mas isso não importa. Uma vez lá dentro, a questão era: a turnê “Infinite Content”, que promove o “Everything Now”, daria o que o público esperava?

Sorte minha que fui um dos poucos a realmente apreciar e curtir “Everything Now” (leia resenha aqui), de modo que o show não poderia ser frustrante. Mas a maioria depreciou o álbum e pra esses talvez ficasse a torcida por um passeio pela discografia e não foco total no disco.

De certa forma, é possível dizer que todo mundo saiu ganhando. “Everything Now” estava lá, inclusive os pontos fracos, como “Peter Pan” e “We Don’t Deserve Love”, mas ao vivo o disco parece ainda melhor, em vista de uma característica da banda: a sua exagerada (e irritante) teatralidade, que casa com o pomposo discurso do álbum.

Os fãs, com um pouco de paciência, puderam aguentar as músicas de “Everything Now” pra cantar juntos, com todos os “aaah”, “uhhh” que o desejado “indie de arena” do Arcade Fire propicia, as canções que fizeram da banda a queridinha dos descoladex, como “Rebellion (Lies)”, “No Cars Go”, “Neighborhood #1 (Tunnels)”, “Reflektor” e “Wake Up”. Foi um show pra fazer valer a pena o abusivo preço cobrado pelo ingresso (que também pode ser creditado como culpado pelo fracasso de vendas).

Depois da abertura do sempre bom Bomba Estéreo, que também vem de dois discos não muito apreciados (“Amanecer”, 2015; e “Ayo”, 2017), o Arcade Fire entrou com uma pataquada de boxe-ringue, pelo meio do público. A banda tenta jogar informação demais, performar demais, teatralizar demais. O excesso também pode ser um elemento na equação do fracasso da turnê, vai saber.

Em “Here Comes The Night Time” e “Haiti”, a bateria da Acadêmicos Do Tatuapé, jogando em terreno conhecido, fez o clichê até soar bacana: o som do Arcade Fire ficou ainda mais festivo e encorpado.

Entretanto, ainda soa tudo muito falso e posado. O Arcade Fire sabe construir suas canções que, caso raro na música pop jovem, não são todas parecidas. A banda se posiciona e faz todo mundo participar de uma maneira ou de outra. Na saída, com “Wake Up”, depois de mais de duas horas e meia de espetáculo, de novo com a bateria da Acadêmicos Do Tatuapé, o Arcade Fire foi mais uma vez pro meio da plateia.

É curioso como o velho dito “escrever certo por linhas tortas” cabe aos canadenses: talvez o tropeço da atual turnê recoloque-os de novo nos trilhos. O Arcade Fire está mais pra uma divertida e inteligente bandinha de faculdade de humanas, com chapéus, adereços, incensos, abraços-coletivos e um discurso adequado aos ouvidos da plateia. Ir além disso, pelo visto, causa estranheza e afasta, infelizmente. Pelo visto, assim, tá de bom tamanho.

Aqui, um vídeo amador, que dá uma ideia de como foi a entrada da banda:

01. Everything Now
02. Rebellion (Lies)
03. Here Comes The Night Time
04. Haïti
05. Chemistry
06. Peter Pan
07. No Cars Go
08. Electric Blue
09. Put Your Money On Me
10. Neon Bible
11. Neighborhood #1 (Tunnels)
12. The Suburbs
13. The Suburbs (Continued)
14. Ready To Start
15. Sprawl II (Mountains Beyond Mountains)
16. It’s Never Over (Oh Orpheus)
17. Reflektor
18. Afterlife
19. We Exist
20. Creature Comfort
21. Neighborhood #3 (Power Out)

BIS
22. We Don’t Deserve Love
23. Everything Now (Continued)
24. Wake Up

Foto: Celso Tavares (G1)

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