CAGE AGAINST THE MACHINE – JOHN CAGE PRA NÚMERO 1 NO NATAL

Vídeo oficial do making of da campanha:

Não, você não leu errado. É Cage Against The Machine e não Rage Agasint The Machine. É bom prestar atenção porque há muito o que se considerar aqui, nessa nova tentativa de tirar o “The X Factor” do primeiro lugar clássico de Natal, tal e qual o Rage Against The Machine fez ano passado.

Após a bem-sucedida ação que levou “Killing In The Name” ao primeiro lugar na semana do Natal na Inglaterra, em 2009, vários grupos se formaram na tentativa de mobilizar seus grupos e músicas preferidas para o mesmo posto este ano. Mas nenhum tem tanta chance quanto esse.

O Cage Agasint The Machine escolheu a peça clássica “4’33″”, escrita em 1952 por John Cage, para a façanha. Se você é daqueles que se preocupam demais com o sucesso do Cine e do Restart estar tirando espaço das bandas que você gosta  – ou que se lamenta demais com “música ruim” baseado nos seus próprios conceitos – e não sabe do que essa peça trata, uma palavra resume tudo: silêncio.

John Cage fez uma sinfonia do silêncio. São quatro minutos e trinta e três segundos, divididos em três movimentos, de silêncio. Vou levar em consideração que o mundo inteiro sabe do que se trata e seguir em frente.

Como eu disse, há muito o que se considerar aqui: ironia, contestação, arte ou piada pura. Todas as alternativas servem como uma luva para a escolha da música como número 1 do Natal. Ninguém pode dizer que não seja perfeita para dizer para o senhor Simon Cowell e para todos os ingleses que a música que eles estão comprando é um lixo. Ou, mais além, que a música que se grava, produz, embala e vende é um lixo: “ei, gravadoras, não queremos mais isso!”.

O próprio nome do “grupo”, Cage contra o sistema, indica isso.

Bom, quem pensa assim, sinto dizer, é um idiota. As gravadoras não estão nem aí se o que vende é o ganhador do “Ídolos” local, se é o Restart, se é a Maria Rita, o Pixies ou o Tiririca; elas querem é vender, oras.

A escolha, nesse caso, é perfeita, ao menos por não fazer o dinheiro acabar na conta bancária de uma dessas gravadoras (ainda há a discussão sobre quem leva os direitos autorais de uma peça tão antiga e já, em teoria, sob domínio público – lembrando que, embora seja silêncio, um vídeo no YouTube que continha “4’33″” acabou tendo que retirar sua faixa de áudio por causa de copyrights. Sério).

Tem o lance da arte. Embora ninguém entenda exatamente a “música”, o próprio John Cage, à época, explicou. Ela tem quatro minutos e trinta e três segundos porque esse é o tempo médio que possuem as horrorosas canções “muzak” (aquelas “ambiente”, que hoje você ouve na sala de espera do seu dentista ou no elevador), num claro tapa na cara da “música enlatada”, como o artista definiu. Lembre-se, era 1952 e era o que tinha de ruim, junto com as big bands e seu repertório pop (o rock’n’roll ainda engatinhava). Como se vê, Cage era mais punk que metade dos punks que já conheci e mais alternativo que todos os clubinhos da Rua Augusta juntos.

Apesar da cara contestadora,  música é, sim, tratada como arte, como você pode ver no vídeo abaixo. A Orquestra Sinfônica da BBC já a apresentou com louvor, merecendo sonoros aplausos.

A piada pura e simples também precisa ser levada em consideração. Entenda, John Cage podia ser um porra-louca, tinha 40 anos em 1952, mas não tenho certeza se ele era um piadista assim tão voraz. Talvez fosse. Entretanto eu trato aqui da escolha da música para essa campanha. Nesse caso, talvez seja a melhor piada do ano.

É bom levar em consideração que não há só essa campanha em busca do posto ganho pelo Rage Against The Machine em 2009: “Surfin’ Bird”, com o Trashmen (e não com o Ramones) está na disputa, mas se perder terá sido só uma péssima campanha de movimentação social-virtual – a música ganhará o selo de que não tem tantos fãs assim dispostos a uma loucura, a “entrar pra história”.

Por outro lado, se “4’33” perder, tudo bem, era “só silêncio”.

Ou seja, é preciso ter por trás da campanha uma ideia ixxxperta o suficiente pra causar espanto, estranheza e até risos meses depois de lançada – e se manter assim até a semana fatal, a ponto de fazer as pessoas abrirem a carteira e levar o disco pra casa -; e ser engraçada o bastante para continuar sendo uma ideia bacana mesmo depois de fracassar no intuito. A peça de John Cage é assim.

A tem, enfim, a ironia. O melhor contestador é aquele que peita com um sorriso no canto da boca, rindo por dentro, talvez só ele mesmo entendendo do que está falando, como se dissesse “os caras são tão idiotas que nem estão entendendo a parada”. Ora, a história da música pop mostra por “a” mais “b” que 99,98% do mundo não vai entender o recado – e eu diria que 99,99% dos ingleses também não, mas esse 0,01% pode dar a vitória ao John Cage, por que não? – de modo que é um triunfo da ironia de qualquer maneira.

E mesmo com o fato de tantos veículos terem noticiado o caso desde julho, quando a ação foi lançada, quase ninguém repercutiu como se imaginava merecedora uma ideia dessas (até agora pouco menos de 16 mil pessoas “curtiram” a página no Facebook, contra os quase 500 mil da campanha do RATM). O que me leva a crer que a ironia prevalece – ainda mais imaginando a cacetada de gente que, quase 50 anos depois, ainda se espanta com uma música ser, na verdade, quatro minutos e meio de silêncio.

A pergunta final – e óbvia – é: o que é música afinal? Qualquer coisa? Sim, eu responderia: qualquer coisa. Depende do seu ouvido, do seu humor, do seu estilo, da sua educação, do seu modo de pensar… Até o silêncio. Ou por outra: sem o silêncio, não haveria música.

E em muitos casos, ainda, é melhor ouvir o silêncio.

“4’33″”, pela Orquestra Sinfônica da BBC:

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Comentários

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Um comentário

  1. Comentando o parágrafo
    “Bom, quem pensa assim, sinto dizer, é um idiota. As gravadoras não estão nem aí se o que vende é o ganhador do “Ídolos” local, se é o Restart, se é a Maria Rita, o Pixies ou o Tiririca; elas querem é vender, oras.”
    Eu lamento muito, mas quem é idiota é você. Se voce souber um pouco de inglês e se informar na página, está claro que eles irão “gravar” a “música” e vender a partir do dia 13. Toda a grana vai para cinco caridades. TODA. Idiota.

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