CONTAINERS – HEREAFTER

O que acontece depois da morte é um dos mistérios mais fascinantes pra ciência, pra religião, pro esoterismo, pras artes e pros pilantras de plantão. Ninguém sabe e provavelmente ninguém nunca saberá.

Tal desconhecimento é crucial pra alimentar o fascínio. Especular é moeda. “Aproveite a vida”, portanto, é o que dizem. Mas é aí que mora o segundo problema e esse é muito mais palpável, real, cruel. A vida não é sempre “aproveitável”, pra muitos ela é indesejável, um fardo. E não saber o que vem depois dela serve pra se vender todo tipo de torpe promessa.

“Hereafter”, o segundo disco do Containers, lançado dia 25 de maio de 2018, de maneira independente, trata um tanto desse conflito. O próprio termo que dá título ao disco – “posteriormente”, “daqui pra frente”, “daqui em diante”, “a seguir” – é um reforço de que manter, especular ou resolver o mistério não ajuda no agora.

Em “Dawn”, a voz etérea deixa claro: “nothing is for now”. Em “We Were Kidding, Sir (What Have You Done?)”, o abuso infantil mostra que “aproveitar a vida” nem sempre é possível. Qual a saída? Escapar? Deixar pra amanhã, como sucede a poesia da boa faixa-título?

Não há resposta, é bom adiantar ao ouvinte. Um dos combustíveis da fé é o mecanismo que curiosamente move “Hereafter”, mas este também não é um trabalho religioso, longe disso. Parece mais pessimista (ou realista – o que, se for, também é pessimismo) e agnóstico e transforma a beleza das canções (musicalmente) em algo profundamente melancólico.

É um dream pop genérico, mas bem agradável (“Dawn” e “Hitchhiker”, principalmente), entremeado por baladas-clichê (“Intolerance”) e um pequeno respiro (“We Were Kidding, Sir (What Have You Done?)”). O disco sofre com uma certa falta de ousadia diante de tema tão precioso. É como aqueles aparelhos medindo os batimentos de alguém em estado vegetativo no hospital: pequenos pulsos mostram que ele ainda está vivo, mas muitos torcem pela linha contínua e o agonizante apito que informa o respiro final. Não há sobressaltos. “Hereafter” pulsa por igual e às vezes parece que a linha contínua vai surgir. Quase não há vida. Ou não há vida propositalmente, pois a vida não é algo pra se celebrar. Diante disso e do mistério do que vem “a seguir”, há um recuo, uma dúvida, ou um temor.

A obra sofre com um outro problema: o vocal. Na faixa-título, com clima e bateria colocando o vocal por trás, encontra-se um equilíbrio interessante, mas é a exceção. A instrumental “I Had Fear Of Ghosts, Until I Realize The Only Ghost Was Me” é outro exemplo de como “Hereafter” é um bom disco de sonoridades apaixonantes, guitarras e arranjos delicados, só que sofre com uma produção sem vida e sem imaginação.

Mas é como diz o dito popular: em vida, não se pode conseguir tudo. É melhor curtir o que temos agora. E “Hereafter” oferece bastante pra isso.

“Hereafter” é todo escrito e composto por Maurício Catellani, com as nove faixas gravadas e produzidas no Estúdio Casa Da Vó, em São Paulo, com mixagem de Jan Pablo e Catellani e masterização de Pablo. A bela arte da capa é de Sid Gambarini.

O disco é o segundo do Containers (aqui, Maurício Catellani toca todos os instrumentos, menos a bateria, que é por conta de Bruninho Marques, além das teclas e guitarras eventuais por Jan Pablo). O trabalho anterior foi o elogiado “Free Of Me”, de 2014 (leia e ouça aqui na íntegra).

1. Get Over (clique aqui pra ver o vídeo)
2. Hitchhiker (clique aqui pra ver o vídeo)
3. We Were Kidding, Sir (What Have You Done?)
4. So Likely
5. Dawn
6. Intolerance
7. Hereafter
8. I Had Fear Of Ghosts, Until I Realize The Only Ghost Was Me
9. Watching Wondering

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