DISCOS (POP) PERDIDOS #12: FINE YOUNG CANNIBALS – FINE YOUNG CANNIBALS

Birmingham, Reino Unido, 1979. As rádios tocam uma versão ska de “The Tears Of A Clown”, de Smokey Robinson & The Miracles, lançada originalmente em 1970. O responsável é The Beat, um grupo que forma um dos pilares do então pulsante “movimento” 2-Tone, com The Specials e Madness.

No fim de 1979 – e pelos próximos cinco anos – o grupo formado por Dave Wakeling (guitarra e vocal), Ranking Roger (vocal), Andy Cox (guitarra), David Steele (baixo), Everett Morton (bateria) e Lionel “Saxa” Augustus Martin (saxofone) protagonizou uma fusão bem sucedida entre os operários do interior do país, a Jamaica e a diversão branca de Londres, onde estava o dinheiro.

Seu maior sucesso, “Stand Down Margaret”, teve a grana doada pra uma organização a favor do desarmamento nuclear. Emprestaram seu talento pro Specials fazer o clássico “Free Nelson Mandela”, que ajudou a libertar o ícone contra o Apartheid. O grupo tinha os olhos voltados pro social.

Mesmo assim, não durou muito. Em 1982, lançou seu terceiro e, até aquele momento, último disco, “Special Beat Service” (em 2006, a banda voltou à ativa e promete um disco novo pra 2015, “Here We Go Love”).

Com o fim do The Beat, Dave Wakeling e Ranking Roger fundaram o General Republic, enquanto Andy Cox e David Steele partiram pra uma aventura mais frutífera até do que o The Beat: fundaram o Fine Young Cannibals.

Pro vocal, chamaram um vocalista de privilegiada voz suave soul, Roland Gift – diz-se que foi por conta de um anúncio na MTV que Roland chegou até eles, mas o próprio vocalista conta que ele fazia parte de uma banda, Akrylykz, que abriu certa vez pro The Beat.

O trio enfrentou problemas no início. Avisaram a Gift que uma banda inglesa liderada por um negro jamais se daria bem nos Esteites. Mas, veja, dinheiro normalmente costuma derrubar preconceitos e bastou o grupo apresentar “Johnny Come Home” num programa de TV britânico e logo as gravadoras queriam aquela estranha banda, que misturava jazz, soul, pop e dance de um jeito bastante cru e único. O potencial era enorme.

Ainda mais quando o grupo mostrou sua versão de “Suspicious Mind” (de Mark James), famosa na voz de Elvis Presley. A dança esquisita de Cox e Steele, o gingado contido e elegante de Gift, o trompete jazzisticamente preciso de Graeme Hamilton, além da participação especial de Jimmy Somerville, a voz de sucesso do Bronski Beat, que havia estourado em 1984, com “Smalltwon Boy”, compunham um quadro perfeito pras paradas de sucesso, agradando garotos e tiozinhos.

Vídeos oficiais de “Johnny Come Home” e “Suspicious Mind”:

Miles Coperland, irmão de Stewart, baterista do Police (banda que excursionou com The Beat), foi o fundador da I.R.S. Records e enxergou ali uma mina de ouro. Logo, contratou a banda. A gravadora é a mesma que lançou o REM, Cramps, Buzzcocks e, claro, The Beat (como The English Beat).

Em 1985, menos de um ano depois de se formar, o Fine Young Cannibals lançava seu primeiro disco, homônimo. O título do disco e banda saiu do original em inglês de “Amantes Impetuosos”, filme de 1960, com Natalie Wood, dirigido por Michael Anderson, “All The Fine Young Cannibals”, inspirado na vida de… Chet Baker.

A capa, num sessentista preto-e-branco-colorido, tem foto de Anton Corbijn. A contracapa tem foto de Paul Slattery. O grande acerto pra esse álbum de estreia foi a contratação de Robin Millar, produtor responsável pelo enorme sucesso, com sonoridade similar, de “Diamond Life”, da Sade, lançado em 1984. Até hoje, ele é conhecido como o “homem que ‘inventou’ Sade”. A engenharia de som e a mixagem ficou com Mike Pela, que também trabalho em todos os discos da Sade. Era um time e tanto.

Millar dosou com sabedoria as batidas dançantes e as guitarras e baixos crus da banda. A voz de Gift, literalmente um presente pra dupla Cox/Steele, soa grave e suave na medida em que ela pode ser. Tudo unido oferece ao ouvinte uma elegância rara na música pop jovem.

Ele trabalhou sozinho em quatro faixas, “Suspicious Mind”, “Move To Work”, “Time Isn’t Kind” e “Like A Stranger”, além de junto com a banda em “Don’t Ask Me To Choose” e “On A Promise”. Mas influenciou todo o resto.

Baladas como “Couldn’t Care More”, “Blue” (um single inexplicavelmente mal sucedido nas paradas) e “Funny How Love Is” expõem uma banda sem apelações, olhando pro passado (o rock dos anos 1950 e o soul dos 1960), no mesmo passo que exige audiência radiofônica, em plena ascensão new wave e pós-punk.

“On A Promise” é um feliz encontro ska-soul-pop e prima direta do hit “Johnny Come Home”. O disco fecha com “Like A Stranger”, uma preciosidade pop, com o balanço característico do Fine Young Cannibals e que apontava o caminho que viria a seguir: “The Raw & The Cooked”, o segundo e derradeiro disco, que seria lançado três anos depois.

O segundo álbum, com os megasucessos “Good Thing”, “Don’t Look Back”, “I’m Not The Man I Used to Be” e, principalmente, “She Drives Me Crazy”, levou o trio às alturas, sendo número 1 nos Esteites, na Inglaterra e na Austrália.

Com uma pegada bem mais pop e radiofônica, “The Raw & The Cooked” foi antecipado pelo rastro do sucesso do seu antecessor. O Fine Young Cannibals acabou sendo chamado pra aparecer em vários filmes, entre eles dois títulos notáveis: “Totalmente Selvagem” (Something Wild), de Jonathan Demme, de 1986; e “Os Rivais” (Tin Men), divertidíssima comédia de diálogos originais, com Danny DeVito e Richard Dreyfuss, que Barry Levinson colocou nos cinemas em 1987.

No primeiro, o Fine Young Cannibals aprontou a cover de “Ever Fallen In Love”, do Buzzcocks. No segundo, veio com quatro canções, incluindo “Good Thing” e uma aparição na tela. Nada disso teria acontecido não fosse o sucesso do álbum de estreia.

A banda acabou em 1992. Gift falou sobre o fim à Express britânica: “eu tava empolgado de que faríamos mais discos, mas pra ser honesto não sei o que aconteceu. Paramos de funcionar como uma banda. Foi bem triste, na real. Havia muita pressão ao redor da gente pra mais discos, mas a música não funciona dessa maneira”. E continua: “quando me tornei pai, em 1991, pensei comigo: ‘dá certo com tudo isso?’. Financeiramente, eu tava ok, então decidir tirar um par de anos, que acabou se tornando vinte! Não me arrependo, porque tive minha vida de volta. Eu e minha senhora estamos juntos ainda e vi meus filhos crescerem. Isso vale mais do que qualquer coisa”.

O Fine Young Cannibals chegou a escrever mais umas canções depois disso. Duas delas acabaram na boa coletânea “The Finest”, de 1996: a bela “The Flame” e a contagiante “Since You’ve Been Gone”. A banda estava em forma, mas de alguma maneira não funcionava mais no seu núcleo.

Sumiu de cena só ouvindo aplausos, do jeito que começou lá atrás, com o The Beat. Elegantemente, sem alarde, a batida cessou.

Fine Young Cannibals em “Fine Youg Cannibals” é:
Roland Gift (vocal)
Andy Cox (guitarra, teclado)
David Steele (baixo, piano)
Martin Parry (bateria)
Jenny Jones (bateria e vocal de apoio em “Couldn’t Care More”)
Graeme Hamilton (trompete, piano)
Gavin Wright (violino)
Saxa (saxofone em “Funny How Love Is”)
Beverly, Gloria e Maxine Brown (vocais de apoio em “Like A Stranger”)
Jimmy Sommerville (vocal de apoio em “Suspicious Minds”)

Álbum – Fine Young Cannibals
Lançamento – 10 de dezembro de 1985
Gravadora – I.R.S. Records
Tempo total – 34 minutos e 29 segundos
Produção – Robin Millar

01. Johnny Come Home
02. Couldn’t Care More
03. Don’t Ask Me to Choose
04. Funny How Love Is
05. Suspicious Minds
06. Blue
07. Move To Work
08. On A Promise
09. Time Isn’t Kind
10. Like A Stranger

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