OUÇA: MALCONTENT – JUST LONELINESS CAN SAVE THE WORLD

O trio português Malcontent não está pra brincadeira. Prestes a lançar “This Is The Violence of Institutions”, terceiro álbum, entendeu que diante da sombra assustadora que toma conta de parte do mundo e que parece querer fazer o planeta rodar pra trás, é hora de se posicionar.

A banda acaba de divulgar “Just Loneliness Can Save The World”, primeiro single do álbum, novamente pelo selo português Honeysound. As guitarras e as montanhas de microfonia e distorção continuam marcas definitivas no som do trio do Porto; mas o grupo vai além das referências aos deuses da guitarra abrasiva Jesus And Mary Chain e aposta em uma música mais pesada, ao seu modo. Ecos de Killing Joke e da fase mais sombria do The Cure – “Faith”, “Pornography” ou “Disintegration”, escolha o seu mais amado – soam perceptíveis ao longo dos quase quatro minutos da faixa. Ou é como se o Depeche Mode convidasse William Reid (o cara que sabe como usar uma guitarra da maneira errada, segundo o próprio irmão, Jim Reid) para uma jam ensurdecedora.

“Foi um processo longo”, conta Sérgio Costa, voz e guitarra do Malcontent, sobre a guinada em direção a um som ainda mais pesado e incômodo. “Logo após o ‘Riot Sound Effects’ (segundo álbum, de 2014), começamos a produzir novos temas e ao mesmo tempo começamos a questionar a nós próprios. Todas as músicas que agora vão sair sofreram um processo longo de maturação. Voltamos atrás muitas vezes. Ouvindo as versões originais você diria que não são as mesmas canções. O mundo evolui, as coisas se transformam e nós não queremos fazer sempre o mesmo”, explica. “Foram quatro anos em que o mundo mudou. Tornou-se mais agressivo, polarizado. Começamos a escrever sobre esse ‘novo mundo’ e isso se traduz na sonoridade, mais agressiva”.

Sérgio assume se tratar de um disco político. Do Porto, ele destaca que a impressão que se tinha, ao constatar as possibilidades infinitas de comunicação que as redes sociais oferecem, era a de que a democracia estava em progresso. “O resultado foi justamente o inverso”, observa, ao perceber que diariamente no usuário das redes sociais – e não só nelas – o cidadão é confrontado diariamente com “verdades absolutas”. Ao condenar a dualidade que só permite ao ser humano enxergar um lado ou outro e se esquecer que a vida vai muito além de um traço que separa o certo do errado, o músico vai buscar em um personagem fundamental da cultura brasileira uma possível resposta: “não existe vontade própria, liberdade de pensamento, e como dizia o grande Nelson Rodrigues, toda a unanimidade é burra”.

“Just Loneliness Can Save The World”, ou “só a solidão pode salvar o mundo”, avança numa ideia excessiva, reconhece Sérgio, com o objetivo de dizer “bem, talvez esteja na hora de dar um tempo”. “Todo mundo é manipulado, muitos falam sem conhecimento de causa. A música é por isso um incentivo à liberdade, um incentivo a termos consciência de nós próprios, a questionarmos o que nos surge pela frente”.

Com lançamento definido para 5 de novembro de 2018, “This Is The Violence Of Institutions” é também um manifesto. Segundo o músico, o disco alerta pra progressiva perda de direitos e pro desrespeito às populações, às diferenças. Atento ao que acontece em todo o mundo, Sérgio vê o drama que o Brasil enfrenta hoje, que acomete também boa parte da Europa, como motivo suficiente pra botar na rua um disco quente, pesado, que não se curva à opressão e que convoca à luta.

“Vocês aí do Brasil se confrontam com a possibilidade de alguém associado à extrema direita subir ao poder. Na Europa, há cenários idênticos. Itália, Hungria, Polônia têm governos contrários ao espírito da própria União Europeia”, cita. E reforça as motivações que fizeram o grupo deixar o hiato de quatro anos sem gravar: chegou o momento de dizer algumas verdades. “É sobre isso que escrevermos, sobre a constante perda de direitos, o retrocesso nas conquistas sociais e sobre a necessidade de as pessoas lutarem contra isso”.

“This Is The Violence Of Institutions” foi gravado no estúdio Cave, em Porto, com produção de Álvaro Ramos, que “também participa com malhas de guitarra” em “From The Beginning”, que abre o disco, e no final, “Till The End”, diz Sérgio. A banda – que é também Filipe Pereira na bateria e Jorge Oliveira no baixo – contou com a ajuda de Filipe Miranda, do Partisan Seed, em vocais adicionais na faixa “Another Kind Of Madness”. Miranda é um dos proprietários do selo Honeysound, e o Partisan Seed, seu trabalho solo, merece atenção.

“Just Loneliness Can Save The World” ganhou vídeo (dirigido por António Sabino) e já está nas plataformas digitais de música pela rede. “This Is The Violence Of Institutions” vai ganhar também versão em CD e, mais adiante, em vinil. “Ainda há ouvintes conservadores que preferem CD”, brinca Sérgio. “Imaginava sentir isso há uns anos? Quem prefere CD é conservador e antiquado? O mundo atual anda depressa, não?”.

Eis a letra de “Just Loneliness Can Save The World”:
He’s got no face, the little sinner
He’s not affraid to pull the trigger
You got to kill, when he slips on your soul
Just loneliness can save the world

All the words were said in vain, and
Our lives are full of pain
Fight your leaders, they’re restless killers
Just loneliness can save the world

All my fears, I’m not in tears
I’ve got nothing left to hold
No ideals can change your soul
Just loneliness can save the world

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