RESENHA: BAD REC PROJECT – EVERY UNION SHOULD BE A LOVELY UNION

As coisas que acontecem conosco, por mais fortes e intensas que sejam, inevitavelmente virarão histórias. E, ao nos afastarmos delas, as camadas que o tempo impõe deixam o passado mais nebuloso. Ainda assim, é necessário resgatá-lo, não pelo clichê de “compreender melhor o presente”, mas porque – em algum nível – a segurança de que fizemos parte de algum fiapo narrativo (enredo) demarca um território que podemos batizar, ainda que abstratamente, de nosso.

O Bad Rec Project narra – com “estranhas” ambientações instrumentais – passagens cotidianas que, no momento em que ocorreram, significavam o mundo e agora, com o peso do tempo, até podem perder certa áurea “mágica”, mas adquirem o corpo mundano e mortal sendo, justamente por isso, mais valorosas. Quando se é jovem e idiota não se tem noção dessas coisas e tudo parece um motivo pra rir – e não há nada de errado com isso, mas também certa idiotice adolescente é reencontrada pela pessoa que nos tornamos e podemos rir daquelas velhas coisas, ainda que por outros motivos.

Com vocais praticamente soprados, as músicas de Caíque Guimarães (o Bad Rec Preoject) atraem porque constroem uma intimidade e não apelam pra sentimentalismos ao dizer-nos coisas de sua vida. Ele procura resolver assuntos inacabados não com afrontas ou tentando culpar todos ao redor e suas circunstâncias, mas reconhecendo a confusão própria – mal sabendo como os acontecimentos o trouxeram neste ponto, mal sabendo o que fazer a partir deste ponto. Mas quem foi que disse que a incerteza não é produtiva?

Quando começamos a pensar nessas coisas as razões se pulverizam na distância secundária. Afinal, houve um tempo em que queríamos apenas diversão. Houve outros em que queríamos apenas distância e silêncio. Não há muita razão pra ficar encabulado com convicções antigas ou sabotagens alheias – antigos amigos têm outras preocupações, outros ainda tentam montar sua banda nos bairros em que viveram a vida toda e parece que só sobrou o garoto teimoso e sua guitarra que ainda não sabe tocar.

Eu tava ouvindo sozinho o disco e acabei pensando nisso tudo e acabei trazendo pra um território bem mais particular do que pretendia. Mas a origem pra toda essa autoconfabulação eu deposito na conta do Bad Rec Project. Porque é justamente esse tipo de música que invoca muita coisa dentro da gente; coisas que, no avançar rápido e doido da vida, não tínhamos parado tanto pra pensar. Eu fico grato por ter gente fazendo isso e capaz de me auxiliar nesses pensamentos fugidios que muito raramente se concatenam pra ser alguma coisa concreta.

1. Love Life Report
2. Bacon & Cheese
3. Art Of The Festival
4. Special Lists
5. Alien Lanes
6. The Great Breakdown
7. Makeyrselfhome
8. Homealone
9. Makeyrselfsamba

NOTA: 7,5
Lançamento: 3 de outubro de 2016 (original) e 26 de junho de 2017 (reedição)
Duração: 23 minutos e 03 segundos
Selo: Transfusão Noise Records e Transtorninho Records (data original) e Crooked Tree Records (reedição)
Produção: Caíque Guimarães

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Comentários

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Um comentário

  1. E eu fico grato que tenha alguém como você que ouviu as musicas do garoto desajeitado aqui. Todas elas tem um pouco de pessoas que fizeram importância na minha vida. São homenagens a elas. Muito obrigado meu irmão, um abração!

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