RESENHA: BNEGAO & SELETORES DE FREQUENCIA – SINTONIZA LA

BAILE BACANA

Quando comprei aquela “Outracoisa”, a revista do Lobão, lá em 2003, em que vinha encartado de graça o “Enxugando O Gelo”, CD de estreia de BNegão e Os Seletores de Frequência, achava que havia aberto uma porta pro que se acostumou chamar de “samba rock” e tornado o ex-Planet Hemp uma rara exceção nas minhas regras de gosto musical.

Mas não, com pouco tempo, é fácil perceber que BNegão não é “samba rock”, longe disso. É soul, é dub, é funk, é rap, é samba e é rock (modelo bem sintetizado em “Bass Do Tambô”, preste atenção na letra). É tudo isso. Talvez esse seja a sua grande virtude num terreno em que não há ninguém transitando com tanta folga e desprendimento – o que é até surpreendente num país tão chacoalhante como o nosso.

Foram nove anos até o lançamento desse “Sintoniza Lá”. Entre um e outro não há muita diferença. Os sopros estão aqui, o balanço está aqui, o peso está aqui, o suingue está aqui. Mas o importante é que BNegão está aqui, com suas letras bichogrileiras e suas tiradas espontâneas, nonsense dentro do conjunto, cheio de toques, conselhos e frases de efeito.

“Vamo!” é um bom exemplo. Dub-jazz classudo, que manda: “esquentem os motores, ativem as turbinas, que vida após vida, o que ela nos ensina, que você não tem espírito, você tem corpo, rapá, pode acreditar, que passageiro não é tripulante, que o que mata sede é água, e não refrigerante, e se a tormenta é passageira, depois dela vem o sol, taí, pode acreditar, que a vida é pra ser vivida, pra ser evoluída, pra isso mesmo que ela existe, por isso, cumpadi, que ela não é uma só”.

Essa é a poesia desconstruída de Bernardo Santos, aquele que “mora em cima do sapato”.

O disco começa com “Alteração (Éa!)”, um bailão, desses de gingar com moças de saia rodada, samba no pé, deslizando pelo salão, sem dar muita bola pra letra – mas que tem justamente na letra inquietante o contraponto interessante da dança: “a música gerada pra gerar alteração positiva e que tem de curtição, na ativa, na estiva, de espírito pra espírito, de alma pra alma, sigo convicto na tentativa de manter a calma, permutando no olho do furacão, mesmo quando o coração aperta, mesmo com o planeta em estado de alerta, seguindo no desafio de manter a mente quieta, a espinha ereta…”.

A verborragia termina com a frase lapidar: “é o pensamento circulando… Livre!”. Quem tem que circular é o pensamento e não os corpos (embora não seja dispensável).

A dupla “panela”, “O Mundo (Panela De Pressão)” e “Reação (Panela II)”, dá um seguimento curioso: desacelera o ritmo, cada uma seu jeito. Na primeira, um baixão manobra o dub com a voz de BNegão ecoando os versos. O mundo, uma panela de pressão, faz explodir os metais. A segunda começa com o molejo do ragga, e constrói uma linha de metais que lembra “O Beco”, do Paralamas do Sucesso.

“Proceder/Caminhar” é um balanço que não faria feio num disco de Tim Maia – nem do Planet Hemp. E voltamos a “Vamo!”, a melhor, carioquíssima.

O disco foi produzido por Pedro Garcia, no Studio Superfuzz, no Rio. A alma carioca está presente, com o gingado e a confusão urbana. BNegão canta a todo instante a insistência de se manter vivo no caos da sua cidade (de qualquer cidade), na selva competitiva que insistimos em alimentar. São versos que batem e assopram: não acredite em tudo, apenas em você, mas tome cuidado, que o mundo é cruel e tals. Calma, balanço e, então, o ataque de metais. “Sintoniza Lá” é todo assim.

O escorregão está em “Essa É Pra Tocar No Baile”, como era a irônica “A Verdadeira Dança do Patinho”, do disco anterior. Uma música pra “descer até o chão”, que aparentemente se envergonha de ser de fato e nunca chega lá.

E tem a porrada hardcore de “Subconsciente”, que lembra de Planet Hemp e, destoando do todo, pode incomodar os incautos que não procurarem entender a “homenagem” da canção (entre aspas porque não sei se de fato é uma homenagem ao PH, apenas soa como – e soa bem).

Mas é pouco pra macular esse baile bacana. Porque “Sintoniza Lá”, como o autor canta a tantas horas, “é a diferença entre uma festa de bacana e uma festa bacana, não é mero detalhe”. Sim, é bacana e é pra todos. É só chegar.

01. Alteração (ÉA!) (clique aqui pra ver o vídeo)
02. O Mundo (Panela De Pressão)
03. Reação (Panela II)
04. Proceder/Caminhar
05. Vamo!
06. Essa É Pra Tocar No Baile
07. Subconsciente
08. Na Tranquila
09. Chega Pra Somar No Groove
10. Bass Do Tambô
11. Sintoniza Lá

Ouça na íntegra:

NOTA: 7,5
Lançamento: 18 de abril de 2012
Duração: 38 minutos e 54 segundos
Selo: Coqueiro Verde
Produção: Pedro Garcia

Leia mais:

Comentários

comentários

10 comentários

  1. já tomou nescau hoje,neném? mamãe já deixou você ir no playground alguma vez? já foi com o segurança dar uma volta na rua um dia? é uma “super” aventura!

  2. Gostei muito da tua resenha cara.

    Ganhou mais um seguidor!!

    Mas depois de falar tao bem do cd, tu da nota 7,5 ?!?

    Poutz, imagina um nota 10 então !srsrsrs….

    Flw’s

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.