RESENHA: CV – NOIR

Abençoados aqueles que têm um pique de produção como o de Thiago Miazzo. Mas além de “simplesmente” ter esse pique, Miazzo tem apresentado trabalhos consecutivos que muito me intrigam. Suas gravações fragmentadas têm ditado os lançamentos, que contam com métodos de impressão sonora aquém dos usuais – não há, por exemplo, forma fácil de determinar o que necessariamente está tocando.

Sua música traz lembranças distintas que guiam o ouvinte pelos terrenos mais imprevisíveis possíveis quando se trata de estimulação sensorial. É intrigante porque soa como outra forma de acessar a oficina mecânica perto de casa sem precisar andar dois quarteirões. E falo isso sobre um viés teoricamente positivo – a indeterminação aliada à repetição produz efeitos fascinantes.

É como se o cv emprestasse sua vontade tortuosa e imprecisa às fitas e as manipulassem seguindo progressivamente desvarios que apenas atravessam o criador. Cheia de indeterminações unitárias (aqui elas parecem não se justapor como em outros trabalhos – leia a crítica de “II”, o trabalho seguinte do projeto, lançado dias depois) e um clima de “defeito contínuo”, “Noir” contém um desafio maior aos ouvintes (desculpe-me, falhei em precisar qual).

O álbum pode ser encarado como uma maneira de relaxamento – ao contrário de outros trabalhos mais agressivos do músico, “Noir” pode muito bem ser tocado como plano de fundo pra outras atividades – embora o destaque seja sempre a condensação bizarra que é transfigurada pra audição.

A percepção contínua sugere uma repetição pro cérebro que vai martelar durante um tempo considerável após o fim do disco. Essas diversas formas de apresentar barulhos muito similares favorecem uma relação específica que talvez o estranhamento inicial afaste: a maneira rígida de se ouvir música sempre foi um ritual muito pobre no que concerne às possibilidades enquanto experiência, no entanto, há sempre uma forma de abrir outros acessos.

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NOTA: 8,0
Lançamento: 3 de maio de 2017
Duração: 18 minutos e 18 segundos
Selo: Independente
Produção: Thiago Miazzo

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