RESENHA: MILOCOVIK – AUTOMATIC COMPLAINTS

Logo nos primeiros minutos de “Automatic Complaints”, reparei que nunca tinha sacado uma banda brasileira que me remetia a esse tipo de sonoridade (obviamente deve existir, mas assim, de cabeça, não lembro). A banda de São Paulo, surgida em 2006 e hoje formada por Claudio Dantas (guitarra), Iran Ribas (baixo), Ito Andery (bateria) e Toni Pereira (vocais), dialoga abertamente com aquele momento no tempo em que o post-punk encontrou as discotecas.

Enquanto as músicas prosseguem no disco, a caprichada produção consegue evitar algo que tenho reparado muito em bandas contemporâneas bem produzidas: apesar do óbvio profissionalismo, não cai em uma plasticidade clichê e alça as músicas pra caminhos que elas objetivam.

Em seu debute de lançamento cheio (a banda conta com o EP de 2009, “Sex Pack”), os vocais dividem o volume com os outros instrumentos. Em pouco tempo de disco, as canções empolgam e o ouvinte não consegue mais se segurar, a partir daí o disco flui facilmente e você vai se encontrar acompanhando os ritmos progressivamente.

“Automatic Complaints” já não conta com mesmice e mesmo assim o Milocovik cria rotas que brincam um pouco com a estrutura interna. As pessoas tendem a julgar discos assim por uma suposta ausência de audácia, mas é necessário ouvir o álbum algumas vezes até que essas “brincadeiras” fiquem claras.

No modo brando que “Automatic Complaints” opera, parece que a construção do disco girou em torno de uma segurança dos músicos enquanto instrumentistas. Se o instrumental é facilmente conectado a um profissionalismo evidente, a polidez e a segurança sonora são ampliadas como acessos e não como barreiras que bloqueiam a experiência e deixam uma sensação de distância.

Desde a faixa de abertura, “Town Meeting”, até o encerramento de disco, com “Muito Mais”, o que soa mais legal na coisa toda é a proximidade (tanto lírica quanto sonora) que liga as canções e amarram o conceito (por mais vago que o termo possa soar) intimista durante as músicas. Através de sintetizadores que avançam com rifes e vozes de fundo, o ouvinte está imerso em detalhes que estruturam – muitas vezes despercebidamente – esse regozijo próprio que perdura durante toda a audição.

O processo de gravação extremamente limpo alavanca essa sensação de prazer e autossatisfação. São registros sonoros que, muito mais do que fechar as possibilidades pro ouvinte, multiplicam as possibilidades interativas (porque a considerável variação de sonoridades tem de ter uma distinção, nesse tipo de disco).

As grandes melodias vocais surgem da mesma forma que a facilidade de sons exibem sua continuidade. Entre gritos de empolgação e vozes de fundo melódicas, o ouvinte é pego sem esforço algum por um aspecto de animação que dialogue com ele sem ludibriá-lo. Em uma época em que produções demasiadamente plásticas frustram muito a experiência do ouvinte com a música, é muito bom lembrar que nem toda boa produção cai nesse limbo (por mais óbvio que seja).

01. Town Meeting
02. Reptile Reaction
03. Fogo Amigo
04. Julie M’a Dit (apresentando Mônica Agena)
05. Safe Island
06. Stay With Me
07. Trouble
08. Someone Else
09. Never Felt So Sure
10. Muito Mais

NOTA: 7,0
Lançamento: 25 de janeiro de 2017
Duração: 42 minutos e 52 segundos
Selo: Tratore
Produção: Edu Recife

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