RESENHA: NICK CAVE & THE BAD SEEDS – PUSH THE SKY AWAY

POP ELEGANTE

Nick Cave é ainda um dos poucos que escrevem poemas e não letras de música. É impossível ouvir suas canções sem se atentar pras bizarrices que sua pena traça. Ele é um rapper boêmio, de madrugadas solitárias. Não fala seus versos, nem os canta. Fica no meio termo.

Sempre achei que caras como ele e Leonard Cohen, por exemplo, mereciam um rótulo específico, algo como “pop elegante”, “pop classudo”, porque é isso que eles fazem: musicam a elegância, o garbo, a imponência, mesmo com temas pouco nobres pros olhos da “sociedade média”.

Degeneração, prostituição, abandono, frustração, decepção, tudo está aqui no novo disco, “Push The Sky Away”, o décimo quinto da carreira dos Bad Seeds.

Mas, com elegância, Nick Cave trata os assuntos de maneira leve e quase introspectiva. Não há esporros, guitarras altas ou pé no acelerador. Cinco anos depois de “Dig, Lazarus, Dig!!!”, de 2008, os Bad Seeds se reúnem (sem Mick Harvey, o braço-direito musical de Cave, mas com forte influência de Warren Ellis, homem de pianos, violinos, violões e afins) pra uma obra que parece feita pra uma pós-noitada, pra ouvidos bêbados, solitários, frustrados.

As músicas parecem vestir sobretudos, ter gomalina no cabelo, um tanto de perfume, ao mesmo tempo em que parecem exigir um novo asseio: a barba já está por fazer, os pés estão cansados, há olheiras.

Nick Cave começa sua verve com a bela “We No Who U R”: “Tree don’t care what a little bird sings / We go down with the due in the morning light / (…) The trees will burn with blackened hands / We return with the light of the evening / The trees will burn blackened hands / Nowhere to rest, with nowhere to land / And we know who you are / And we know where you live / And we know there’s no need to forgive”. É o abandono cantado até o fade.

Ele parece um contador de histórias meio distante da ação, meio cansado de tudo o que passou. Depois de tudo, parece sentir o peso da solidão.

Mas, claro, Nick Cave, o autor, não está sozinho. Sua esposa, Susie Bick, está ali na capa. Aquele é o seu quarto. Ela está nua. Aquilo é a sua intimidade. Ele deixa a luz de fora entrar: está aceitando se expor, mas prefere narrar com distanciamento, prefere continuar sendo um personagem criado por ele mesmo. Ou vários.

“Wide Lovely Eyes” é uma bela canção de amor, cheia de metáforas e belos versos (“The night expands, I am expanding / I watch your hands like butterflies landing”). Ela acalma. “Water’s Edge” começa com um baixo misterioso. Cave está mais dramático. E “Jubilee Street” canta a prostituição e o amor desperdiçado. Uma das canções do ano, a única que os Bad Seeds chegam perto de algum esporro.

Ouça “JUbilee Street”:

Quer dizer, até você chegar a “Mermaid”, com seu refrão simples, grudento e encantador: All the ones who come / All the ones who go / Down to the water / All the ones who come / All the ones who go / Down to the sea”. Ou até você avançar até “Fishing Jubilee Street”, uma continuação que não é uma continuação; ou a epopeia da insanidade sobre o futuro que é “Higgs Boson Blues” (“Who cares, who cares what the future brings?”), com demônios, Robert Johnson, Hannah Montana/Miley Cyrus, uma longa estrada rumo ao desconhecido, e um título que demonstra que a banda está ligada no presente.

“Mermaids”

Todas elas são Nick Cave e sua turma contando histórias tristes, ou engraçadas, ou curiosas, ou mesmo, como na faixa-título, otimistas (“I was right / I was right / Oh, the sun, the sun / The sun is rising from the field”).

Na verdade, não importa tanto o conteúdo. A forma parece mais importante. Nick Cave faz música pop como poucos: eloquente, bela e divertida. E sempre com elegância.

Ouça “Push The Sky Away”:

NOTA: 8,5
Lançamento: 18 de fevereiro de 2013
Duração: 42 minutos e 47 segundos
Selo: Bad Seed Ltd.
Produção: Nick Launay

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