RESENHA: ORCHESTRA BINÁRIA – EP#02

As referências científicas de “EP#02” sugerem alguém que busca uma continuidade, ainda que subjacente. Eu suspeito que embora a banda fale sobre decidir parâmetros necessários pra uma especificação completa, o eu-lírico tem a certeza que tal desnudamento (o movimento que revela a verdade) é um descobrir contínuo de sonoridades, verborragias e melodias.

Há um paradoxo intrínseco no EP que é o eu-filosófico que tenta desesperadamente encontrar o eu-matéria. Este último, indeterminável, sempre em construção e sempre em dispersão. Livrado dos conceitos. O próprio desenvolvimento lírico assume este paradoxo e é justamente um testemunho do dualismo que é formulado durante toda a gravação. Os próprios meses citados na primeira faixa – que teoricamente seriam sinônimos de uma localização temporal mais objetiva – são significâncias abstratas, alheias a uma aplicação propriamente concreta. A aplicação é voltada pra explicitar um movimento e pra isso é necessário todas as invocações – científicas e sonoras – do EP.

A Orchestra Binária acredita em explorações menos convencionais e leva ao ouvinte um polo em que as batidas estão em constante movimentação sem um motivo específico – o mundo sempre exige mais motivos. Há uma crença, então, nos motivos não explicitados, nos motivos que não podem ser decodificados – o que não implica numa impossibilidade de tentativa de compreensão. Porque tentar compreender é mais do que um conhecimento teórico. É uma possibilidade de apreender o mundo dos sentidos apresentado com uma soma (palavra-música) que se convencionou chamar de arte.

A tentativa é conduzida principalmente pelo instrumental, que evidencia múltiplos caminhos quaisquer de uma possível apreensão. A representação de estados de dúvida e conhecimentos advindos destes questionamentos são materializados na expressão externa, nos cortes sonoros e nas transições rítmicas. Há respostas-rápidas pra perguntas constantes. Porque as certezas não ficam vagando fincadas em um plano, e por isso a necessidade da multiapresentação de canções que não fiquem estagnadas em determinado sentido. Porque estagnação representa uma certeza inabalável e este é justamente o terreno que a Orchestra Binária não quer se acomodar. Por isso, as músicas sempre se desprendem dum suposto eixo central pra espalhar seus sons de diferentes formas.

Apresentar mais variações não apenas deixa o ouvinte mais crédulo na música enquanto experiência como aprofunda a estética do EP. Embora predominantemente focado na iminência poética, o lirismo de “EP#02” aposta em objetos definidos (valium, vinho quente) pra evidenciar também as possibilidades de sensações.

Porque o mundo gira e em cada objeto (ou em cada som) há a possibilidade dum desdobramento. A incipiência que o projeto se encontra evidencia que a Orchestra Binária prepara coisas muito boas. Uma banda que não se permite a óbvia decifração e assim o ouvinte pode reivindicar seu espaço interativo.

1. Maio
2. Gira (A Girar)
3. Galileu
4. Parametrizar
5. Decodificando

NOTA: 7,0
Lançamento: 21 de novembro de 2016
Duração: 19 minutos e 17 segundos
Selo: Independente
Produção: Orchestra Binária e Emygdio Costa

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