RESENHA: TIGANÁ SANTANA – VIDA-CÓDIGO

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As músicas que Tiganá Santana toca desaguam em uma construção aberta para recolhimentos de externalidades. Na segunda faixa, “Palavra De Honra”, há uma clara apreensão de um som quase ambiente que vai se recolhendo até ser um retrato rítmico e íntimo do compositor. Se seu “blues não seduz’, é porque suas confissões são telas cruas de um momento ainda mais dramatizado pela música. Esses gritos estão desesperados por ecos em quaisquer lugares possíveis, pois o silêncio absoluto seria, evidentemente, pior do que tudo.

Se o silêncio é ameaçador porque ele seria um fim da expressão, os ritmos socorrem o músico com seus fragmentos, às vezes “quebrados”, construindo-se como alternativa. Em “Disu Ye Mvula”, a construção é quase sensorial, apelando pra uma percepção sensível da composição de significados.

A beleza de “Vida-Código” é que transita numa linha tênue, sincera, dos diversos comportamentos pelos quais a música de seu compositor migra. O disco dramatiza os medos do músico enquanto, paralelamente, constrói um mito de expressão em seus belos acordes.

As imagens e poesias arremessadas, como na faixa “Vida Código”, recusam uma paz estagnada porque encontrar tal calmaria, que seria a morte. Se a vida codifica os comportamentos e homogeniza as expressões, a música pode ser um passaporte de reencontro duma expressão originária. Como um relato a partir das impressões de formas, o que se desenha é a tentativamente profunda de movimentos que recusam uma simbologia imóvel. Como um receptáculo, suas músicas se adaptam às visões que o mundo insistentemente oferece – sem ordem, sem motivos específicos.

Se essas preocupações artísticas e existenciais não fossem reconhecidas por Tiganá Santana, elas soariam despersonalizadas. Mas é justamente por virem à tona com tanta dor que se pode vislumbrar o mesmo abismo do compositor. Com tiradas como “Não Vás Preta”, o sentido de negação ganha um acúmulo de inclusão, em que uma realidade objetiva é constante negada pelos desejos.

Mas o que “Vida-Código” arremessa, no fim, é um elo profundo com as chamadas raízes musicais que criam um campo poético em que contrariedades não se anulam. De um jeito peculiar, é uma maneira muito explícita de não se resignar a realidade imposta. Ao invés disso, é melhor criar. E criar.

1. Flor Destinada
2. Palavra De Honra
3. Disu Ye Mvula
4. Ilê, Se Eu Não Gostasse De Você
5. Meios
6. Vida Código
7. Aclarate
8. Do Fundo
9. Não Vás Preta

NOTA: 7,0
Lançamento: 28 de fevereiro de 2020
Duração: 31 minutos e 08 segundos
Selo: Ajabu!
Produção: Tiganá Santana e Sebastian Notini

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