OS DISCOS DA VIDA: FLAVIO TESTA – 505 INDIE

A seara “indie” da Internet brasileira é uma piada de péssimo gosto, como sabemos bem. O ambiente é habitado por sites e blogues que fazem tudo por um convite VIP, um presentinho, um toma-lá-dá-cá. Não há nada de errado disso, se o leitor perceber do que se trata e puder, por conta própria decidir se fica, volta ou puxa o carro dali.

Mas há exceções boas (eis a bíblia de sites brasileiros de música que o Floga-se segue e recomenda, uma lista que é dinâmica e muda com frequência), e uma delas é o 505 Indie, de Flavio Testa. Divertido, bem humorado, visual bacana, com boas resenhas, o site é um bom lugar pra quem não tem tempo de procurar notícias de suas bandas preferidas por aí – a velocidade de hard news aqui é boa pra esse fim. Há boas entrevistas também, com bandas novíssimas, dessas indies que fazem a festa em festivais como o Planeta Terra.

Flavio é o criador do veículo. Curitibano, tentou tocar o empreendimento informativo do Paraná, mas logo teve que ampliar os braços pra São Paulo, Londrina e Belo Horizonte. Hoje, tem mais de quarenta mil seguidores, juntando as duas principais redes sociais (até 2013), está sob o guarda-chuva do site da MTV é embaixador oficial do Planeta Terra (numa escolha bastante acertada da organização do festival).

Nessa edição de “Os Discos Da Vida”, Flavio, 31 anos, que era “metaleiro” na infância, lista os discos que o incentivaram e montar em agosto de 2011 um dos veículos que mais rápido cresceram e um dos mais legais hoje em dia, voltado à linguagem pop e jovem.

É uma boa lista e é coerente com seu nicho: com uma inspiração dessas, a chance de dar certo era realmente boa.

FLÁVIO TESTA

MGMT – “Oracular Spetacular” (2007)
A psicodelia encharcada no pop, alguns recursos de música eletrônica como aliados. Não tinha ouvido nada parecido até então, de Jefferson Airplane a The Flaming Lips. Foi a partir daqui que eu tomei gosto de verdade pela psicodelia dentro do rock. E a partir disso assimilei melhor as obras antecessoras de outras bandas e de outras épocas. Até hoje, é um dos meus temperos favoritos quando usado na medida certa.

Ouça “Kids”:

The Strokes – “Is This It?” (2001)
Moleque de dezenove anos quando este álbum foi lançado. Devidamente baixado no Napster, tempos em que já tinha “renegado” o metal completamente. O The Strokes foi o carro abre-alas pra todo o samba do indie rock que entraria na avenida pelos próximos sete anos (ouvi dizer que tem banda que ainda insiste nisso em 2013). Sonoramente e esteticamente bem diferente de tudo aquilo que eu vinha ouvindo, o grunge/alternativo americano e o britpop/indie britânico basicamente. Nesse sentido, foi sim um disco de ruptura: assimilado, possuído e esgotado.

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Ouça “Last Nite”:

Morphine – “The Night” (2000)
Está relacionado a uma garota. Sempre elas. Ouvi esse álbum em 2001, a marca profunda que deixou e a forma como eu devorei a carreira do Morphine posteriormente, inclusive, não é o meu disco favorito do trio, “Cure For Pain” e “Like Swimming” são bem melhores. Tudo isso aconteceu com maior intensidade entre 2001 e 2004, certamente uma banda da vida. O groove e o grave. A lamentação foi não ter a chance de acompanhá-los antes que a fatalidade interrompesse o trabalho.

Ouça “The Night”:

Travis – “The Man Who” (1999)
Lembro até hoje do dia que Fábio Massari apresentou, no “Lado B”, o videoclipe de “Why Does It Always Rain On Me?”. A letra entrou profundamente na cabeça do então adolescente de dezessete anos, enquanto Fran Healy cantava quase afogado: “Why Does it always rain on me? Is it because I lied when I was seventeen?”. Depois dessa madrugada, pra eu descobrir a banda e tornar “The Man Who” como um álbum da vida foi um passo natural. Quatro das minhas cinco músicas favoritas de toda a discografia estão neste disco.

Ouça “Why Does It Always Rain On Me?”:

Trilha Sonora – “Trainspotting” (1996)
Principalmente por “Born Slippy”, do Underworld, e “Perfect Day”, do Lou Reed, pelas cenas que carregam essas duas músicas históricas. Através deste filme (e trilha sonora em CD), eu abri algumas portas na música eletrônica e em paralelo, por todo o repertório do Velvet Underground. Não foi amigo, não foi namorada, não foi o dono da loja de CD, não foi a MTV, não foi caderno de cultura… foi o filme “Trainspotting” que me colocou no eixo da eletrônica pra os gostos de Kraftwerk e Depeche Mode (me dói não incluir o “Violator” nessa lista), logo depois veio o Basemant Jaxx e o Ladytron também. Já na via do Lou Reed, pude descobrir todo o derrame de Velvet Underground, a sequência por um lado da música como forma de arte. Primal Scream e Brian Eno foram conhecidos e provocados através deste álbum também. E no caso do Primal Scream, forneceu um dos meus discos favoritos de todos os tempos, algum tempo depois.

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Ouça “Perfect Day”:

The Cure – “Wild Mood Swings” (1996)
Esse cCD tocou até furar lá em casa. Tenho certeza que entraria na lista da minha irmã também. The Cure era um dos poucos pontos em comum em nossos gostos nestes tempos. Apesar da execução maníaca desse cd, na faixa dos quatorze aos dezesseis anos, hoje com o pensamento crítico um pouco mais desenvolvido e tendo conhecido o catálogo completo, o álbum permanece entre os meus 5 favoritos. Faixas como “Want”, “The 13th”, “Numb”, “Club America” e até mesmo “Mint Car” são músicas que pouca gente liga, muita gente não gosta. Pra mim soam como hits.

Ouça “Want”:

Pato Fu – “Gol De Quem?” (1995)
Eu fui alvo de chacota no colégio, oitava série em 1996, porque pedi esse CD de amigo secreto. A pressão foi tão grande que eu coloquei “¡Adios Amigos!”, do Ramones, na lista só pra desbaratinar a molecada. Ganhei Ramones. A professora de história – ela tinha me tirado – me deu Ramones, porque não encontrou Pato Fu na loja. O Pato Fu ficou na minha cabeça, mas eu só fui ouvi-lo na íntegra uns três anos depois e nunca mais saiu da minha playlist. A responsável por provocar essa curiosidade foi a MTV e o clipe de “Qualquer Bobagem”, cover e o que eu descobri ser uma das mais fracas neste SENHOR trabalho.

Ouça: “A Volta Do Boêmio”:

Guided By Voices – “Propeller” (1992)
Londrina deve ter a maior proporção de fãs do Guided By Voices pelo total de habitantes no Brasil. A quantidade de pessoas que gostam dessa banda por lá é insana. “É” – no presente – porque muitos que estão na faixa dos trinta e poucos continuam lá e, claro, gostando das mesmas coisas: Guided, Pavement, Pixies, Breeders, Dino Jr., Sebadoh, Yo La Tengo, Sonic Youth e alguns outros. Mas encabeçado pelo GBV. Nesta época eu ainda era mais ligado ao metal, mas as turmas de HC, alternativo e metal costumavam interagir numa boa. Uma pessoa me apresentou esse álbum pela faixa “Quality Of Armor” no fim dos anos 90 (98? ou 97?). Eu sei que não tinha carteira de motorista ainda. Mas esse disco, a partir dessa data, nas viagens de busão e depois dirigindo um carro, sempre foi trilha sonora obrigatória. Disco pra, se possível, ouvir de janela aberta, alto, competindo com o barulho do vento pela prioridade dentro da sua cabeça.

Ouça “Quality Of Armor”:

Milton Nascimento – “Ao Vivo” (1983)
Esse disco cheira almoço e tem o som da voz da minha mãe. Só a lembrança dela entoando “Cavaleiro marginal banhado em ribeirão” é capaz de embargar tudo por aqui. É um disco que está longe de figurar entre os meus favoritos da nossa MPB, mas é o que traz as lembranças ternas e verdadeiramente familiares sobre o que eu sou, ou de onde eu vim.

Ouça “Paisagem Na Janela”:

Rainbow – “Rising” (1976)
Eu já tinha toda a discografia do Dio com o Black Sabbath quando comprei este disco, além do “Holy Diver” da carreira solo e o “Long Live Rock’n’Roll”, do Rainbow, a parceria com o Blackmore. Então, eu encomendei o “Rising”, na House of Rock, antiga loja de CD2s em Londrina, responsável pelo ensino fundamental dentro da minha educação musical, onde eu não conheci apenas o metal, mas também muito do HC e algo do punk. Voltando ao assunto, sem brincadeira, o “Rising” demorou mais de sessenta dias pra chegar, depois do primeiro mês eu passava uma vez por semana na loja pra ver se tinha chegado. O cara mexia no catálogo e abria caixa na minha frente pra aumentar o sofrimento. Um dia o telefone tocou. “Flavio, seu CD do Rainbow chegou”. Poucas vezes ouvi palavras tão doces nessa minha vida. E depois, ouvindo o disco do começo ao fim e seguidamente, encontrando o seu ápice sempre em “Stargazer”, o CD era algo maior, muito maior do que simplesmente música. Vocês, jovens de hoje, nunca saberão o que é isso. Era uma peça lançada há vinte anos (na época), mas inalcançável de audição, pois ninguém tinha. A Internet só existia em www.cnn.com ou www.nba.com, provavelmente.

Ouça “Stargazer”:

Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Japanese Bondage”.

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