PENSE OU DANCE: ROCK IN RIO – EU NÃO FUI, MAS ME DIVERTI

A quarta edição do Rock In Rio em solo brasileiro acabou nesse domingo, dia 2 de outubro de 2011. Eu não estive lá, mas foi como se estivesse – e me diverti um bocado. A Internet e a televisão proporcionaram uma proximidade absurda não só pra “ver” e “ouvir”, mas pra “perceber” o que foi o espetáculo.

Muitas pessoas passaram os sete dias dos shows tuitando suas impressões sobre as apresentações, basicamente do Palco Mundo, o principal, inclusive gente que estava lá, permitindo uma visão curiosa e ampla do que foi o festival. Foi divertido ler em até 140 caracteres as bem-humoradas tiradas sobre o que acontecia no palco e fora dele, na transmissão épica do Multishow, que mostrou ao vivo praticamente todas os shows do palco principal.

Assim, quem não foi até a Cidade do Rock pode dizer sem medo que praticamente esteve lá. E foi um festival curiosíssimo. É preciso, pois, destacar alguns pontos importantes desses sete dias, aqueles que valeram pra estampar na história do festival como o mais engraçado e risível de todos os tempos.

O Rock In Rio faz jus à sua abreviação.

1. Transmissão ao vivo do Multishow.
Muita gente ficou incomodada com Didi Wagner e Luiza Micheletti embromando o tempo todo, entre uma apresentação e outra, munidas de informações tiradas da Wikipedia. Eu achei engraçadíssimo, afinal é um prato cheio pra diversão ver duas moças totozinhas se embananando, metidas num mato sem cachorro. Didi, que foi mais tiete que jornalista, tomou cantada de Lenny Kravitz, passou cantada em Chris Martin e quase lambeu o chão em mais uma entrevista chapa-branca com a delicinha e boa-praça Shakira. Um prato cheio e suculento pras gargalhadas.

Beto Lee foi uma vergonha pra família, sendo obrigado a falar que todo show “foi demais”, a ponto de até a Rita Lee, sua mãe, ter que se manifestar publicamente, via Twitter. Não dava pra não rolar de rir.

Tinha também as entrevistas ao vivo, na área vip, com globais e famosidades fora do ambiente habitual, da redoma de vidro que é a Globo, que viraram referências históricas no quesito pagação de mico. Christiane Torloni virou hit e meme instantâneo, com seu “é dia de rock, bebê”, criada pela sua mente avariada. Impagável.

Era, na verdade, um festival dentro do festival. De horrores. Gente rock’n’roll de toda espécie deu as caras naquela boca-livre patrocinada pela família Marinho: o sertanejo-romântico Daniel, Adriana Estevez e sua trupe familiar, William Bonner doidão, Juliana Paes e uma dezena de semi-celebridades e afins, limpando o dente daquele resto de canapé, enquanto respondiam qualquer coisa incompreensível. Mas eu traduzo: todos babando ovo na organização. Nunca vi ninguém reclamar ou criticar boca-livre. Tá tudo certo, tudo nos conformes. Tinha uiscão e cerveja de graça, né, bebê?

A transmissão tratou o público com a mesma profundidade e relevância de informações que os pagantes ali exigiram da organização na escalação dos artistas. Na verdade, tanto fazia: o importante era a festa, era estar ali, participando do evento, e se trocassem o local por Salvador no Carnaval ou Rio de Janeiro na Apoteose, dava na mesma. A Globo conseguiu padronizar até mesmo suas patasquadas e sua matéria-prima pra chacota nacional. A gente agradece.

Agradece também as entrevistas hilárias que a dupla de pernocas fazia ali no estúdio. Didi e Luiza recebiam os artistas imediatamente após os shows, no calor da emoção, pra desfilar uma série de elogios, a ponto de ganhar de Ivete Sangalo vários afagos diretos durante o show. Era jogo ganho. Era tudo uma questão de encher linguiça – e de piadas pra timeline alheia. Valia errar nome de música, do entrevistado e insistir pro cara ver na tela atrás dela o que ele acabara de fazer ali no palco.

Uma enrolação. A dupla enrolou tanto, as repórteres de campo enrolaram tanto (destaque pra escultural porra-louquice de shopping center que é a sobrinha da Malu, Erika Mader, e sua beleza estonteante), que após o último show do Rock In Rio, já às cinco da matina de hoje, a trupe apareceu pra se despedir de todos aliviada. Deve ter sido um tormento. Mas no SWU estarão todos lá novamente.

Mas não precisava ter sido, por certo. Muita coisa ficou de fora das transmissões. Por exemplo, um passeio pela Cidade do Rock. Não se viu a tal Rock Street, o parque de diversões, o público. Não houve uma matéria relevante sequer sobre o local. Salvaria a pele dos apresentadores entre um show e outro. Jornalismo risível, como seu conteúdo.


Todas as fotos deste post foram tiradas por Davi Rocha, via iPhone, às seis da matina do dia 3 de outubro, na Cidade do Rock já vazia, após o show do Guns’n’Roses.

2. Twitter.
Nunca foi tão divertido ficar até altas horas na Internet lendo os tuítes de meus seguidores e seguidos. Ah, a criatividade do brasileiro… A oferta de bolas quicando de frente pro gol era farta. A todo momento as pernocas gentis das apresentadoras do Multishow ofereciam uma frase de efeito pra fazer qualquer um gargalhar. Acho que nem o Bolsonaro, dono do mau humor mais contundente da atualidade, aguentou, lá no cantinho da sua residência, e soltou um riso abafado. Os artistas, então, com suas apresentações perto do constrangedor, se ofereciam lânguidos pra uma longa listas de piadas e tiradas de efeito. O riso é a melhor saída. Ver o Rock In Rio assim é mais divertido.

Lúcio Ribeiro presentou a turba com as melhores tuitadas no seu “o melhor do Twitter”. Desafio o nobre e raro leitor a não se esfacelar sem ar, de tanto rir.

Mas engraçado mesmo é a reação dos reaças. Além do próprio Rock In Rio, o RIR também nos fazia rir. A cada tirada de sarro, os fãs daquela banda-alvo se sentiam no dever de achincalhar quem criticava, quem se divertia com a vergonha alheia. Não se pode falar mal de artista, ora bem.

Eu mesmo recebi algumas apaixonadas declarações de repúdio por ter ousado rir das apresentações de gente como o Coldplay, o Capital Inicial, o SOAD, o Guns ‘n’ Roses, o Red Hot Chili Peppers e o Jamiroquai (bom, eu ri de todos, na verdade). Essas bandas fizeram apresentações pra lá de constrangedoras, na minha visão. Mas os fãs não gostam dessa opinião. Os fãs não gostam de nenhuma opinião que não seja o elogio rasgado. O certo é eu dizer que foram apresentações maravilhosas, inesquecíveis, tal e qual um Beto Lee eufórico, cheio de brilhantina e sorvete na testa, pensando no montante que vai pingar na sua conta bancária. Todos esses fãs histéricos e deslumbrados têm um Beto Lee dentro de si (opa!).

Cheguei a receber um tuíte de uma fã do SOAD, questionando se eu ficaria feliz com alguém falando cobras e lagartos de uma banda que eu gosto. Minha resposta é a mesma que dou aqui há seis anos: sim, eu até apoiaria e incentivaria a galhofa. Pode falar mal das bandas que eu gosto. Só prefiro que sejam obervações sarcásticas e irônicas, pra que o assunto chegue às vias da diversão e da bandalha.

O artista taí pra isso, pra ouvir troças e, na mesma medida que é adorado, poder ser achincalhado. Se não sabe lidar com isso, melhor mudar de ramo. O diabo é que fã não muda de ramo, vai ser fã sempre – e chato.

3. Axé x Rock x Qualquer Coisa.
Uma das coisas mais divertidas desse Rock In Rio foi a discussão sobre o lineup. “Não era rock”, questionavam os torturados fãs de sei lá o quê. Eu digo que o Medina fez o certo. Meteu cem mil almas desafortunadas por dia naquele fim do mundo pra ver uma lista deprimente de artistas. Encheu o bolso de dinheiro.

Decidiu tudo na base de resultados de pesquisas, algo que todo empresário decente deve fazer antes de lançar seu produto. Vamos discutir, então, o gosto do povão. Ou o gosto de quem reclama. Um dos dois tá errado. Medina não. Esse ganhou seus milhões aí, e vai voltar em 2013 com um novo show de horrores pra fazer mais dinheiro. Ele é que riu por último, certamente.

Mas hilário mesmo é discutir sobre a entrada do axé num festival dito de rock. Ora, isso me parece um caso bem parecido com o pênalti no futebol. Não me lembro de juiz, cercado por jogadores em fúria, voltar atrás na marcação de uma penalidade máxima. Sobram, no máximo, uns cartões amarelos aos reclamões. Aqui, é a mesma coisa. Os milhares de babões da legitimidade do rock ficaram meses reclamando sobre a inclusão de Ivete Sangalo e Claudia Leitte, enquanto os Medinas iam vendendo ingressos. Não dava pra voltar atrás, certo? Tudo me pareceu saliva desperdiçada, pose desmedida.

Então, veio a reclamação durante os shows. Motivos de piadas, as duas cantoras levantaram bandeiras pós-show, em defesa de uma tal “liberdade de expressão” na música, aquele blá-blá-blá politicamente correto de que “cada um ouve o que quiser”, mas se esqueceram de avisar ao próprio subconsciente de levar ao cabo os próprios argumentos. O tico não conversou com o teco e deu nisso. Senão, vejamos: Claudia Leitte defendeu o axé a ponto de comparar os detratores a nazistas ou coisa que o valha, mas meteu ali no seu setlist Chico Science, Led Zeppelin e Rolling Stones, além de umas guitarras safadas. Ivete Sangalo meteu a faca entre os dentes e partiu pra cima dos linguarudos, dizendo que “nada é mais rock n’roll que o axé”. Pelo embate furioso, temo dizer que ela tem razão. Falta só sair cuspindo por aí, minha rainha, pra virar algo como um axé-punk.

Tudo motivo pra piadas e mais piadas, numa discussão que não levaria a lugar nenhum. Sangalo chegou até a desconstruir de vez o próprio empregador, o Medina, e merecia aplausos por isso, ao dizer pro seu público esquecer que estavam todos no Rio, pra imaginar que estavam em Salvador. Sim, já não era rock e a partir dali também não era Rio.

Os detratores, esses também foram matéria polpuda pra boas piadas, devem ter se doído agudamente, ao olhar aquelas imagens aéreas com a Cidade do Rock lotada com um fervilhante público nem-aí pras críticas. Acho até que só não tinha mais público porque muita gente ainda devia tá pagando as parcelas da viagem ao Carnaval de Salvador. Não tá fácil pra ninguém.

4. Shows e ex-bandas.
O mais importante foram as bandas, né? Como vimos, nem tanto. Esse é um festival que vai além das apresentações em si. Houve surpresas bastante agradáveis (e olhe o que eu vou dizer, preste atenção), como a “gordinha” Katy Perry e um dos shows mais animados via TV que já vi. Entendo você ter até 17 anos e gostar disso. Não é vergonhoso, contanto que o seu processo de amadurecimento dê conta de apagar tal registro e deixá-lo pro seu passado.

Já com Shakira o elogio é diferente – e não vai só pra aquela calça preta de proporções libidinosas bíblicas: a moça foi basicamente competente, algo que nenhum outro headliner conseguiu, nem mesmo o superestimado show do Stevie Wonder, de uma sonolência atroz. Ela rebolou – é paga pra isso também – cantou, tocou guitarra, animou seu público e rendeu também algumas piadas, tudo por conta do seu namorado Piqué e os trocadilhos que advêm do nome dele. Nada contra a apresentação em si, percebe?

Já Coldplay, Lenny Kravitz, Red Hot Chilli Peppers e, principalmente, Jamiroquai e Guns’n’Roses, esses são piadas prontas. As apresentações nem foram todas enfadonhas – principalmente se você for um daqueles fãs xiitas que te xingam na Internet se você falar mal de uma dessas bandas – mas eram todas um mais do mesmo soporífero capaz de colocar pra dormir o mais catedrático dos insones. Ou fazer rir: pode-se colocar sem dó todas elas na categoria fulgurante das ex-bandas em atividade, que vivem de shows em lugares como o Brasil e de fãs xiitas.

O Rock In Rio, pois, fez-me rir. Cumpriu seu papel de divertir. Mas em 2013 poderia ser um pouco mais contundente, um festival com credenciamento pra relevância artística, e não só pra intento financeiro pro investidor ou conteúdo pro humorista popular. Se a ideia e abrir espaço pra todos, é preciso perceber que muita gente ficou de fora. Medina riria melhor no final se aqueles que fizeram piada tivessem também comprado um ingresso.

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Comentários

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7 comentários

  1. Falando de festa: Shakira , delícia .
    Falando de música: A única apresentação que parei para ver foi do Coldplay , que apesar de não gostar da banda, achei audível.
    Acredito que festivais como esse servem apenas como diversão para menores de 18 anos dizerem com orgulho que estiveram lá e depois de 5 anos se envergonharem disso.

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