PRIMAL SCREAM NO HSBC BRASIL – COMO FOI


Fotos: Ivan Pacheco/Terra

Não há muito o que discutir: 1991 foi um daqueles anos ao qual a música pop, jovem e, àquele momento, independente, tem uma dívida eterna. Esses anos são raros, quando surgem alguns discos que se lançam pra eternidade. “Screamadelica”, o terceiro do Primal Scream, foi um desses.

O álbum colocava na garganta de todos o distúrbio lisérgico daquela época doidona na Inglaterra. Embora, como dizem, quando o sistema trata um movimento “das ruas” (aqui, no caso, dos clubes) como arte, quando assimila uma expressão como forma de ganhar dinheiro é porque esse “movimento” está pra morrer. Foi o caso. “Screamadelica” é realmente um disco pra eternidade, mas seus filhotes foram apenas embalados pela tentativa de tirar proveito da onda. O que só aumenta a importância do disco: ele é a ação, o fato, a causa e a própria consequência; um disco, um momento, que se fecham em si.

Quem viveu aquele momento, mesmo que a milhares de quilômetros de distância, como aqui no Brasil, consegue compreender esse show, essa importância. É saudosismo, de modo que a plateia do HSBC Brasil estava recheada de gente entre 35 e 45 anos. Nem mais, nem menos. É um disco que acertou em cheio uma geração (como tantos outros lançados em 1991). Não se chateie se você não consegue “captar” tal aura: você só não estava no lugar certo, no momento certo. É compreensível.

O Primal Scream não rejuvenesceu seu público, mas mesmo que o tivesse feito, o momento “Screamadelica”, aquele de 1989 a 1991, jamais voltaria ou poderia ser compreendido na íntegra, na pele, no coração, sensitivamente, por esse novo público.

Pra quem está nessa faixa, uma certeza: que baita honra poder ver o Primal Scream encher os bolsos com nossa grana em troca de uma apresentação dessas! As dez músicas de “Screamadelica” foram tocadas (todas, já que “Higher Than The Sun” se repete no disco, totalizando onze), numa ordem alterada, juntando as canções mais lentas num bloco central e permitindo um final apoteótico. Depois, um bis mais rockão, com “Country Girl” (de “Riot City Blues”, de 2006) e “Jailbird” e “Rocks”, duas do “Give Out But Don’t Give Up”, de 1994 – note, a banda precisou de três anos pra juntar os cacos da loucura que foi essa fase e fazer um disco novo; e o novo trabalho já olhava pra outro caminho, deixando o “Screamadelica” no passado, como de fato deveria ser.

Ou seja, é o próprio Primal Scream mostrando que “Screamadelica” se encerrou em si, foi uma exceção (embora “XTRMNTR”, de 2000, seja quase tão genial quanto, o mais próximo que a banda chegou de repetir a perfeição). O lance deles é guitarra, baixo e bateria, rock e tals.

Sorte de quem estava lá, naquele momento, naquela hora, em 1991. E ontem, revivendo tudo, ao vivo, com aquela explosão de cores no telão, nas luzes, com a guitarra altísisma de Andrew Innes; com o baixo distorcido de Mani, outro ícone da época, quando era do Stone Roses; e, claro, com Bobby Gillespie, o gênio que um dia foi “só” o baterista-que-tocava-em-pé no Jesus & Mary Chain, cumprindo seu papel de Delorean lisérgico que nos levou de volta ao passado, de volta àquela história.

O setlist, com “Movin’ On Up” começando lá em cima, e o encerramento com a trinca inigualável de “Higher Than The Sun”, “Loaded” e “Come Together” (inserindo a versão do single no meio), é daqueles que merecem o status de aula: como conduzir o público de forma eficiente.

Era um convite. “Come together as one”: vamos juntos lembrar aquela época. Como um só, todos sabiam do que se tratava. Há vinte anos, a totalidade da audiência ali estava entrando na terceira década de vida, o auge da juventude, da festas mais loucas, das porra-louquices da idade. Agora, só responsabilidade, contas pra pagar, filhos, carreira, prazos, pressão, estresse, trânsito… A loucura é outra.

Ver durante “Loaded”, Gillespie novinho, com sua meia-lua, em câmera lenta no telão ao fundo, fez com que muitos lembrassem de si mesmos vinte anos atrás, quando o mantra “We wanna be free/We wanna be free to do what we wanna do/And we wanna get loaded/And we wanna have a good time/We’re gonna have a party” era repetido ao máximo, com a mente variada. Todos ficaram chapados e tiveram seus bons momentos. A vida hoje segue seu curso, normal, cada um no seu canto, separados, com suas respectivas famílias. Bola pra frente.

Mas de vez em quando é bom lembrar.

01. Movin’ On Up
02. Slip Inside This House
03. Don’t Fight It, Feel It
04. Damaged
05. I’m Comin’ Down
06. Inner Flight
07. Higher Than The Sun
08. Loaded
09. Come Together

BIS
10. Country Girl
11. Jailbird
12. Rocks

“Movin’ On Up”

“Come Together”

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