RESENHA: NO JOY – WAIT TO PLEASURE

EQUILÍBRIO PERFEITO

O apadrinhamento não serve mais. Ou os apadrinhados ficarão melhores e mais relevantes do que o padrinho. Quando Bethany Cosentino, da Best Coast, disse que a No Joy era a “melhor banda de todos os tempos”, uma superlação títpica dos adolescentes em tempos de Twitter, na época do lançamento do bom primeiro disco, “Ghost Blonde”, de 2010, valeu como aviso pra que todos prestassem atenção a essa banda meio californiana (Jasamine White-Gluz), meio canadense (de Montreal, Laura Lloyd).

“Ghost Blonde” era uma brincadeira shoegazer-lo-fi sem muitas qualidades além da muralha de distorções típica de quem aprecia o estilo. “Wait To Pleasure”, o segundo disco, é exatamente o que “Ghost Blonde” deveria ter sido: shoegazer sim, mas não só.

No trabalho de estreia, as meninas foram comparadas a Lush, Swervedriver, My Bloody Valentine e Husker Dü. Elas se incomodaram. Mesmo assim, seguiram em frente, com suas ideias.

O processo do novo disco começa onde terminou o anterior: Sune Rose Wagner produziu o primeiro álbum e chegou a trabalhar nesse segundo, mas a banda não sentiu que a coisa estava funcionando, e começou do zero, pelas mãos de Jorge Elbrecht. Inacreditável a diferença.

O resultado se vê logo na primeira faixa, “E”. O No Joy mostra que não em matéria de distorção, “Wait To Pleasure” não brinca em serviço. Logo de cara, toneladas de pesos em camadas, baixo e guitarra estremecendo as caixas de som de tal modo que é capaz de até mesmo os ouvidos mais acostumados se sentirem incomodados no minuto final. Por trás, aquela doçura feminina e praiana, uma melodia singela. Pronto: Jasmine e Laura podem se regozijar, elas acharam um ponto de equilíbrio.

Trata-se de uma mistura nem tão distante, mas dificilmente tentada: os Beach Boys praianíssimos encontrando-se com o My Bloody Valentine e o Ride pra uma jam. Mas não só. Na jam de “Wait To Pleasure” aparecem muitos outros “convidados” interessantes, de punk a electrotrash, mas em doses tão sutis, sob as camadas de distorção, que vira adorno, enfeite mesmo.

“Hare Tarot Lies” é o primeiro contato com o pós-punk que vai ajudar a dupla a formatar sua obra. É uma balada hipnótica, mas totalmente oitentista, que manda lembranças diretas ao Cocteau Twins, assim como “Lunar Phobia” (curiosamente, as duas melhores). “Prodigy” oferece alguns ruídos a la “Psychocandy”. “Slug Night” reduz as camadas e oferece uma limpeza ali no meio, mostrando que é uma canção bem (perdão o clichê) ensolarada. Sim, a dupla conseguiu o equilíbrio.

Veja o vídeo oficial de “Hare Tarot Lies”:

Ouça “Lunar Phobia”:

“Blue Neck Riviera” parece perdida ali no meio, com seu electrotrash lascivo. Tem uma batida quebrada, parece feita pra rebolar, mas é só impressão: o pancadão tem também suas distorções e certamente não vai funcionar pra animar festa alguma.

O baixão que inicia “Lizard Kids” avisa que vem porrada pela frente. E vem. A canção é um slow-punk cheio de balbúrdia, distorção (claro). Não há muito tempo, mas dá pra bater cabeça. “Wrack Attack” volta a ser oitentista, pós-punk, bem como “Ignored Pets”, desafiada pela psicodelia calma de “Pleasure”, que não se trata do “prazer” do título do disco.

Ouça “E”:

O prazer do disco, pro ouvinte, está numa obra deliciosa e equilibrada em suas referências, ousada por buscar o incômodo da sua estrutura, acima das melodias fáceis. Pra banda, o prazer está em descobrir que seu ideal de música pop pode ser desenhado e compreendido. Ele existe.

O No Joy finalmente nasceu pro prazer da arte.

NOTA: 9,0
Lançamento: 23 de abril de 2013
Duração: 36 minutos e 10 segundos
Selo: Mexican Summer
Produção: Jorge Elbrecht

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