RESENHA: THIAGO FRANÇA – A ESPETACULAR CHARANGA DO FRANÇA – O ÚLTIMO CARNAVAL DE NOSSAS VIDAS

Em janeiro, eu quero dar adeus a todas as coisas que fizeram 2015 um pouco mais difícil. Infelizmente, não dá. Resta dançar e tentar encontrar vestígios verdadeiramente alegres em manifestações (tradicionais ou não). O carnaval logo menos está aí e temos poucas opções; ser um desses chatos que fica reclamando em redes sociais ou tentar aproveitar o feriado com pessoas e músicas que nos fazem extrapolar. Thiago França preferiu montar uma equipe e sair por ai andando pelo centro de São Paulo.

E nem é necessário decorar alguma melodia pra sentir o incêndio que os músicos que o acompanham causam; é um amontoamento de ritmos que, ainda em seu embalo, ultrapassam a mera “marcha de carnaval” (quando as guitarras surgem, por exemplo). A receita de França é revisitar um estilo tão divulgado em fevereiro e dar guinadas mais atuais. A música torta, de alguma maneira, se encontra presente em “O Último Carnaval De Nossas Vidas” e revela o quanto ela, aos poucos, se torna imprescindível pro cenário brasileiro.

Não é uma banda qualquer. Tem Amilcar Rodrigues (trompete), Allan Abbadia (trombone), Anderson Quevedo (sax barítono e flauta), Filipe Nader (tuba), Welington “Pimpa” Moreira (bateria e agogô), Samba Sam (surdo) e o próprio França (sax alto, tenor e arranjos), com participações especiais de Douglas Germano (cavaco e voz em “Marchinha Do Pitbull”), Kiko Dinucci (guitarra em “O Capitão Do Sax” e “Ferro Na Boneca”), Juçara Marçal (voz em “O Capitão Do Sax” e “Eu Vou Pra Fornalha”), Rômulo Fróes (voz em “Adeus Saudade”), Tulipa Ruiz (voz em “Cara Do Apetite”), Rodrigo Campos (guitarra em “Adeus Saudade”, “O Bom Marido” e “Eu Vou Pra Fornalha”), entre outros.

A banda de França nos convoca pra ir à avenida, cita A Banda Do Zé Pretinho, e contundentemente nos leva não apenas em sua empolgação, mas no paralelo inventivo que realizam com marchas tradicionais de carnaval. Pra compreender essa inventividade a qual me refiro, é necessário analisar mais que o instrumental (que já se mostra constantemente renovado) e também reparar temas como a uniformização de certo estereótipo de corpo domina em muitos lugares paulistas. São denúncias das uniformizações constantes a qual somos diariamente submetidos. Se as velhas marchinhas tratavam de temas da época com evidente bom-humor e sarcasmo, toda turma de “O Último Carnaval De Nossas Vidas” não poderia fazer de outra forma.

Ouça na íntegra:

Cortamos caminhos e vamos pra Santa Cecília; o cheiro de urina, as purpurinas, os botecos, os moradores de rua, as construções antigas e as estações do metrô – a banda de Thiago França, que é o “capitão do sax”, musica alegremente flagras de nosso cotidiano e nos faz um dos convites dos mais improváveis: “vamos dançar em homenagem às nossas alegrias e desgraças?”. Quando canções irônicas como “Marchinha Do Pitbull” surgem, elas também denunciam uma ameaça que poucas pessoas relatam; a uniformização cultural que certas pessoas paulistas tentam enquadrar nossas deformidades.

Não aguentamos essas imposições e por isso dançamos, ficamos de olho na atual movimentação musical porque isso dá prazer. Contamos e ouvimos histórias porque precisamos de entretenimento. Nós deixamos a saudade pra depois porque queremos ser felizes, queremos aproveitar o carnaval. Não há empolgação que fique freada, mesmo em faixas lentas como “Adeus Saudade”. O instrumental vai chamar tanto sua atenção que você vai esquecer que estava dançando há um minuto. A cidade está cheia de mal, mas ainda assim cantarolamos melodias e tentamos nos afirmar nessas ruas.

França tenta buscar vida além dos padrões que preenchem nossa querida São Paulo; seus compositores constroem retratos dessa cidade e o “capitão do sax” e sua turma tornam tudo uma enorme celebração. Por mais que França realize constantemente trabalhos importantes pro desenvolvimento de nossa música contemporânea, seu novo disco e sua turma afirmam, com alguma nostalgia, que dá pra ser original em absolutamente tudo.

01. O Capitão Do Sax
02. Marchinha Do Pitbull (homo pitbullicus)
03. O Trombonista
04. Adeus Saudade
05. Gourmetizada
06. Cara Do Apetite
07. Santa Cecília De Itabirito
08. O Bom Marido
09. Ferro Na Boneca
10. Eu Vou Pra Fornalha
11. Brasirodim

NOTA: 7,0
Lançamento: 1º de janeiro de 2016
Duração: 34 minutos e 31 segundos
Selo: Independente
Produção: Rodrigo Funai e Thiago França

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