OS DISCOS DA VIDA: MY MIDI VALENTINE

Vou começar com um preconceito bastante comum: o My Midi Valentine é de Alagoas. De Arapiraca, precisamente. Nas décadas de 1980 e 1990, sem Internet disponível, os discos e músicas e bandas demoravam pra chegar ao Brasil (a, basicamente, São Paulo e Rio de Janeiro – e aqui entra o preconceito comum – imagine então pra chegar a Maceió, Arapiraca e afins!): só se você tivesse grana boa pra importar e olhe lá, porque na maioria das vezes o problema era simplesmente o básico, saber se as bandas existiam.

Pois os anos 2000 e a Internet, a de banda larga, ajudou um bocado a eliminar as barreiras da distância e do desconhecimento. Agora, informação flana por aí com facilidade faraônica. E neste post estamos falando de uma banda que teve seu crescimento musical por essa época. Não é, pois, de se admirar o amplo leque que você vai se deparar nessa lista.

Há de tudo aqui, de clássicos a novidades do novo século, passando por música experimental, jazz e tudo o mais. Essa nova edição de “Os Discos da Vida”, com a My Midi Valentine, encerra a questão do preconceito, se é que ela ainda existia (espero que não), e explica um tanto a guinada genial que a dupla deu no novo disco, “The Fall Of Mesbla”, em relação ao EP anterior, “My MIDI EP”.

Tales Maia e Marcos Cajueiro ouviram um bocado de coisa pra “moldar” seu som, graças aos novos tempos, à tecnologia, e ao bom gosto nas escolhas, claro. Ou, se preferir, já estava tudo no DNA, faltava diminuir as distâncias.

TALES MAIA

“Minha vida tem um buraco absurdo dos 10 aos 20 anos, é complicado explicar. Eu poderia fazer isso dez vezes e as dez vezes listar cinco discos diferentes. Mas nesse momento, esses são os cinco CDs da minha vida”.

Super Furry Animals – “Phantom Power” (2003)
A banda começou por volta de 1995, e eu só fui conhecê-la treze anos depois. A primeira música que lembro de ter ouvido foi “The Piccolo Snare”. Nessa época, eu tava muito vidrado em Grandaddy. Não conseguia achar nada que soasse como eles, por mais que procurasse. Foi fuçando nesses Last.fm da vida que recebi uma indicação. Ouvi a música que falei e “putz, que música”… No fim, não tem tanto haver com Grandaddy, mas me agradou de uma maneira incrível. As variações no CD todo fazem como que seja bem completo. Pega uma vibe experimental, passa por um rock sujinho e ainda solta um pop chicletinho. Pra mim foi uma surpresa. Prova de que existe muita coisa por aí que eu ainda não ouvi e que a gente pode ser surpreendido a qualquer momento.

Ouça “Sex. War & Robots”:

The Delgados – “Hate” (2002)
Como diria o meu amigo Marcos: “como, porra, você acabou gostando/conhecendo essa banda quando ninguém nem sabia do que se tratava?”. Bem, eu lembro que sempre gostava de assistir aquele programa “Alto Falante”, na TV Cultura. O cara anunciou um clipe da banda The Delgados. O disco se chamava “Hate”. O que eu já achei foda. Vi o clipe, ouvi a música e na mesma hora fui pra Net procurar. Baxei o CD e, tipo, pra mim foi uma descoberta muito foda. Até hoje ouço muito esse disco, que inclusive, consegui comprar numa banquinha do Festival Coquetel Molotov, ano passado. Saí do evento lokão com a galera, feliz da vida. Peguei um táxi e a primeira coisa que pedi foi pra colocar o disco. Fui cantando todas as músicas até chegar ao destino. Mesmo um pouco alterado e abatido, foi uma noite muito, muito feliz.

Ouça “All I Need Is Hate”:

Hefner – “The Fidelity Wars” (1999)
Eu não tenho uma memória muito boa. Dos últimos quinze anos da minha vida, não consigo organizar muito bem o que aconteceu, nem quando aconteceu. Só sei que depois que ouvi Hefner, muita coisa mudou. No review da PopMatter, o texto começava assim: “If I said I loved you, would you still hate me?”. É um disco que fala de decepções, corações partidos e essas bad vibes que eu tanto gosto. Não que eu tenha me decepcionado muito. Mas, enfim… Diria que é um disco da vida pra mim porque eu ainda ouço ele uma vez por semana, acho que isso basta.

Ouça “The Hymn For The Alcohol”:

Grandaddy – “The Sophtware Slump” (2000)
O que falar dessa banda? Jason Lytle pra mim é um gênio. Poderia citar qualquer um dos outros discos, “Under The western Freeway”, “Sumday”, “Just Like The Fambly Cat” etc. Todos ótimos discos. Mas esse disco em especial tem uma vibe muito foda. Essa coisa meio “Broken Heart Robots”. Pra mim, de longe, um dos melhores e mais completos discos. Daqueles que você sempre vai ouvir e nunca vai enjoar. Sempre vai ouvir mais um barulhinho, um vocal abafado escondido. Vale a pena mesmo parar pra ouvir com mais carinho.

Ouça “Miner At The Dial-A-View”:

Beck – “Sea Change” (2002)
O que falar desse disco? Depois do “Fidelity Wars”, do Hefner, vão achar até que eu sou um cara sofrido, amargurado. Mas é impossível negar. “Sea Change” é o maior conjunto de “Broke Up/Broken Heart Songs” de todos os tempos. Você só precisar dar o play, deitar na cama e deixar o CD te levar por todos os seus problemas amorosos. Só eu sei o quanto ouvi esse CD. Às vezes, pra potencializar a destruição, às vezes pra passar por ela e, na maioria das vezes, simplesmente por que é um CD maravilhoso. Com melodias muito fodas, letras mais ainda e no final de tudo, dá até pra se apaixonar de novo, ouvido esse infeliz. É o tipo de disco que recomendo pra todo mundo. Pra quem quer amar, odiar ou simplesmente ficar de boa. Mesmo que o tema “Post-break up” esteja tão presente.

Ouça “Lonesome Tears”:

MARCOS CAJUEIRO

Legião Urbana – “Mais Do Mesmo” (1998)
O ano era 1998 e por incrível que pareça eu nunca tinha ouvido falar o nome dessa banda. Era Carnaval, eu estava na praia e meu pai chegou com o CD. Colocou no carro, comecei a escutar. Passei o resto do Carnaval dentro do carro decorando as letras. Legiao Urbana é uma banda muito foda. Sei que existe muito preconceito. Algumas coisas saturaram, os fãs chateiam, mas é a melhor banda do mundo (depois do Pink Floyd).

Ouça “Será”:

Led Zeppelin – “IV” (1971)
Eu fazia 8ª série e foi um cara na minha sala organizar uma gincana. Ele tinha uma revista. Uma edição de aniversário da Showbizz. Era uma revista grande e tinha o Led Zeppelin na capa. Peguei pra ler e não ouvi mais uma palavra do que aquele cara falou. No final, ele disse: “pode ficar com a revista”. Eu nunca tinha ouvido o Led, mas passei dias lendo e relendo a história deles. Foi aí que pensei “essa é a vida que eu quero”. Meses depois, fui ao shopping com meus primos pra assistir a um filme no cinema. Antes de começar a sessão, fui à loja de CDs só pra dar uma olhada e lá estava ele: “LED ZEPPELIN IV”. Peguei o dinheiro que eu tinha pra pagar a entrada do filme e ainda faltava uns quatro reais. Tive que convencer meus primos a me emprestar. Eles acharam meio absurdo mas acabou rolando. Fui pra casa e dei play, começou a tocar “Black Dog” e eu ouvi o Led Zeppelin pela primeira vez! Tudo fez sentido.

Ouça “Black Dog”:

Pink Floyd – “The Final Cut” (1983)
Assim como no CD do Led, comprei esse sem nunca ter escutado música alguma. Era muito foda fazer isso! Gostava de Pink Floyd, mas não conhecia o álbum. Morava em Maceió com um primo. Tínhamos ido para lá apenas pra estudar, então não tinha som no apartamento. Acho que passei umas duas semanas lendo o encarte e imaginando como seriam as músicas. Como não havia previsão de ir para Arapiraca e ouvir o disco em casa, não aguentei e fui ao apartamento de uma vizinha. Pedi o som dela emprestado, corri pro apartamento e pude enfim ouvir as letras que eu já tinha decorado. Roger Waters botou pra arrombar e superou todas a minhas expectativas.

Ouça “The Final Cut”:

William Basinski – “The Disintegrantion Loops” (2002)
Esse disco mudou toda minha concepção de música. antes disso música “experimental” era o que o Xiu Xiu fazia. Percebi que existe um universo infinito além da estrutura da música pop ocidental. P.S.: é o disco mais tocado em festas da Popfuzz.

Ouça “dlp 1.1”:

Chet Baker – “Chet Baker Sings And Plays For The Film ‘Let’s Get Lost'” (1987)
Ouvia muito falar de jazz, mas tinha preguiça de ouvir. Uma vez tava rolando um carnaval “Popfuzz” na minha casa. A gente pegou um monte de Playboys velhas, começou a recortar as mulheres nuas e fizemos um mural muito bonito. Um desses recortes ficou pelo chão e havia uma matéria sobre discos importantes e tals. Alguém citou esse, gostei da descrição e algum tempo depois baixei. Virei fã de jazz e comprei um trompete. Dpois descobri que aquele som suave que ele tira é de um flugelhorn. Agora quero um flugelhorn!

Ouça “Let’s Get Lost”:

Na próxima edição de “Os Discos da Vida”, Locomotiva Discos.

Na edição anterior, “Os Discos da Vida: Sin Ayuda”.

Leia mais:

Comentários

comentários

2 comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.